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A Renascer Produções Culturais organiza o Seminário Internacional de Crítica Teatral desde 2005 evento que reúne estudantes, profissionais e estudiosos de diferentes formações acadêmicas em um compartilhar de experiência, opinião e conhecimento dos mais diversos países, com o propósito maior de fazer avançar o desenvolvimento do discurso crítico sobre a criação teatral, em todo o mundo. O exercício da crítica de teatro como disciplina e a contribuição para o desenvolvimento das suas bases metodológicas constituem, assim, a prática do Seminário Internacional de Crítica Teatral, levada a cabo por críticos do teatro e uma gama de especialistas nas áreas de conhecimento que entrecruzam comunicação, história, filosofia, arte, literatura e teoria teatral, dentre outras. O Seminário Internacional de Crítica Teatral é um projeto que busca implementar no estado de Pernambuco um espaço permanente de debate sobre a estética teatral contemporânea. A edição 2011 tem como tema o Teatro fora dos Eixos. Todas as atividades desenvolvidas pelo seminário terão como base a discussão das poéticas cênicas que estão se propondo em produzir trabalhos que estão fora do cânone do teatro ocidental.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Leitura Crítica - Do moço e do bêbado Luna

DO MOÇO E DO BÊBADO LUNA


Márcio Braz

A chuva que caiu no penúltimo espetáculo do Seminário Internacional de Crítica Teatral não desanimou os atores e, muito menos, o público que se fez presente no Pátio São Pedro, no dia 04 do corrente mês. Pelo contrário. A águas caíram para abençoar o talentoso elenco de “Do Moço e do Bêbado Luna” do Grupo de Teatro de Rua Loucos e Oprimidos da Maciel. O “último dos beatniks”, como era considerado Erickson Luna, poeta pernambucano, era o pendor poético da encenação como “a lama das chuvas” dos céus de Recife.

As obras do famoso poeta recifense foram tranpostas para o palco (rua) de modo sério e acanhado. Uma vez que a montagem acerta em adaptar para a rua o espetáculo (o poeta era um conhecido “bebum” e atraía toda a sorte de intelectuais, artistas e políticos) por outro lado erra na construção narrativa, lembrando, muitas vezes, um sarau.

Os poemas de Erickson Luna são livres, soltos, irônicos e de uma musicalidade causticante, lembrando, em alguns momentos, o poeta amazonense Aldsío Filgueiras, o mais “torto” dos poetas da região norte. Na transposição para o palco, faltou, contudo, um jogo maior de elementos que pudessem trazer à tona um pouco da familiaridade e da popularidade do poeta. Ficamos diante de um recital de poesias e o jogo estabelecido com a marcação de cenas e o uso de adereços ficou restrito à ilustração dos textos e não ao jogo dramático.

O espetáculo cresce quando o público é chamado a participar. Talvez seja seu ponto alto onde a roda é aberta para que o público interfira de modo direto seja criticando algo sobre a cidade, seja recitando um poema, uma canção, em suma, trata-se de um momento que nos liga diretamente a psiqué do poeta.

A narrativa ficou distante exigindo um pouco mais do público no que diz respeito à compreensão do que era dito e as ferramentas utilizadas para tanto. Sabemos da tradição dos poemas que, na época dos rapsodos gregos e medievais, a poesia era cantada e, só posteriomente, passou a ser escrita, mas até hoje a métrica é musical. Como estamos tratando de uma outra conjuntura seria interessante, por exemplo, a personagem do poeta ser vivificada. Não se trata, é claro, de uma novidade cênica, mas talvez, dentro da proposta pretendida pelo grupo que é recitativa, a presença da personagem Erickson Luna poderia trazer um pouco de prosa (ácida e polêmica como ele) de modo a dar um ritmo e colorido ao espetáculo alem de conhecermos esta outra faceta do poeta que é a de um proseador autêntico, personagem dos bares e querido pela intelligentzia recifense.

No mais, o espetáculo “Do Moço e do Bêbado Luna” tem muito o que caminhar principalmente no que tange a tradição de espetáculos de rua (ou na rua, o que é outro formato) no Brasil. Com a certeza de vê-los afinados no discurso, respaldo a integridade e a sinceridade do projeto.
Experimentos cênicos do segundo dia do RECIFASTTEATRO


Por George Carvalho

O segundo e último dia do RECIFASTTEATRO, dentro da programação do Seminário de Crítica Teatral, no Teatro Capiba, no SESC de Casa Amarela, reservou melhores surpresas que o primeiro, de um modo geral. A maioria das cenas apresentou melhor coerência e também performances mais profissionais, apesar de algumas incongruências que causaram certa estranheza. A primeira delas está mais para esta última definição.

Sobre-viver, vi-ver, ver apresentou uma história confusa, inacabada, com atuações sofríveis e uma dramaturgia frouxa. Muito cenário e muitos atores para um enredo aquém do que prometia a sinopse. Demarcações de palco clichês e um jogo de cena mal explorado completam a esquete. Só a aparição do repórter Nostradamus Pereira perece digna de algum elogio. A performance é interessante, apesar de exagerada, e o ator mostra uma energia que não é compartilhada pelo resto do elenco.

Já em A outro, o que não falta é energia no monólogo de uma travesti que compartilha com a platéia suas lembranças, desejos e frustrações. No palco, uma cadeira, um cabide e uma penteadeira. Cenário enxuto para não desviar atenção do texto forte e preciso, muito bem vivenciado pelo ator em cena. A iluminação é discreta, um pouco clichê, não influi nem contribui tanto. O jogo de luz poderia ter sido explorado mais em favor da carga dramática que o texto carrega.

Na pele de uma prostituta desgraçada pelo próprio irmão, Hermínia Mendes surge na pela de Giorgia, terceira cena da noite. Sua interpretação firme, cheia de nuances distintas, que vão do temor ao prazer, é encantadora. A transformação da ingenuidade feminina na força de uma mulher marcada pelas intempéries da vida se faz aos olhos da platéia, diante de uma iluminação objetiva e uma marcação cênica forte e coerente. Pena que essa não tenha sido a única participação da atriz no segundo dia do RECIFASTTEATRO...

Mas antes disso, Manu Costa, Rogério Vanderley e Manoel Francisco levaram a cena Dois pra lá, dois pra cá. O que seria a consolidação carnal de um encontro proibido entre dois colegas de trabalho, acaba virando frustração quando o rádio anuncia a morte da estrela da Música Popular Brasileira, Elis Regina. A trilha sonora com interpretações da cantora, dubladas por um rádio inusitado posto em cena, delicia o ouvido da platéia. A sintonia do casal em cena impressiona. E a atuação é primorosa, assim como o cuidado com o figurino. O primeiro encontro amoroso se descortina em uma história sutil e cômica, plena de poesia cênica que a voz de Elis ajuda a declamar.

Mancha de Sangue foi uma experiência cênica superficial e sem graça. Na época da Inquisição, quatro prisioneiros que seriam mortos na fogueira na manhã seguinte travam uma discussão e são influenciados por um deles a se matarem, em vez de aguardarem pela fatídica sentença. A morte de três deles revela a salvação do quarto, através de um acordo. Música alta e uns pulos antes de iniciar a cena. Um líquido altamente letal, que faz um prisioneiro tremer e outro não na hora da morte. O contexto da obra é capaz de suscitar inúmeras discussões e reflexões que passam despercebidas na cena que foi apresentada, do modo como foi tentado.

Por fim, E se fosse você... Aqui, exatamente agora? trouxe ao palco o monólogo cômico de Léo Castro. Com uma presença cênica impressionante, ele conta histórias inusitadas e brinca com personagens do meio teatral, entre outros perfis urbanos do cotidiano. Sacadas inteligentes, como o motivo do figurino engravatado, e uma mensagem divertida aos críticos teatrais.

O teatro para falar do próprio teatro foi um recurso que o Clã de Nós (RJ) já tinha mostrado com Mais um, apresentado nesse mesmo festival. No entanto, enquanto da primeira vez, tal recurso servia como pano de fundo para uma reflexão mais contundente, em E se fosse você... o metateatro aparece mais como uma saída para situações cômicas. Nesse ponto, a proposta do primeiro me parece mais louvável.

De um modo geral, os interessantes experimentos cênicos apresentados no RECIFASTTEATRO demonstram o quão louvável foi a iniciativa da organização do seminário em promover esse espaço para exibição de performances tão distintas, nos mais diversos aspectos, sejam eles dramatúrgicos ou temáticos. Essa diversidade merece ser ressaltada e repetida anualmente, assegurando a importância de ações como essa, que a Renascer Produções Teatrais tem proporcionado ao movimento teatral, junto aos outros inúmeros atos que envolveram execução desta edição do Seminário de Crítica Teatral.

Leitura Crítica - Barrela

michelotto locuto, causa infinita®


Barrela

comum sem serventia sem qualidade imprestável, espécie de caldo obtido da cinza proveniente de queima de espécies vegetais. Onde se fabrica o artesanal sabão de bola, a barrela, a ticuada é um de seus componentes.

EXERCÍCIOS DE ADMIRAÇÃO

Crias de Mãe Júlia/Caruaru e seu Plínio Assustador

Aristóteles dixit que é o topos, um lugar, que nos pensa. Nesse festival seminarístico três peças me chamaram atenção especial por serem assim aristotélicas: @.com, uma nau que descia os rios impassíveis de Rimbaud, o Mãe- in loco que trocou o grego pelo latim para dizer que ela se realiza num topos preciso, e claro, Barrela em que fomos feitos prisioneiros imprestáveis, cinzas prá sabão duma limpeza de espaços vitais impossível.

Não há felicidade maior para um professor, creiam-me, que ver seu aluno soprando cinzas para manter acesa a chama. E foi por isso que eu dei aquele abração no Moisés que acompanhava aulas com olhos viajantes de menino que tateia o chão quando engatinha, cada vez como primeira vez. E hoje, ocupa por aí o meu lugar, vindo de uma longa linhagem que foi de Snoek, foi de Barthes, Vandergucht e de alguma maneira se iniciou em Heráclito olhando fixamente as águas do rio, tentando, vão, achar-lhes o vau para fixar suas margens em nossa memória que então só tinha 01 byte, mas com que fome mordia esse Heráclito!

E foi indo com muita fome ao pote que me cansei de falar nesses dias sobre minhas ressalvas aos textos malditos, pois o problema é que só se é maldito em um lugar. Eu fui expulso daqui e em Paris eu era exatamente un mec qualquer. Na melhor das hipóteses “mon refugié politique” com que se apossavam de nós os franceses, carinhosa mas possessivamente.

Estou seguro e sereno, e não deprimido, de que o lugar de muitos de nós e de muitos desses textos foram os anos 50/60, antes de virarmos- textos & textículos- cinza, barrela. Também cansei-me de evocar meu cumpadre S.Beckett- vou colocar aqui minha foto em Paris, sentado num banco na avenida, uma tarde inteira, em frente ao endereço dele, esperando, Lucky, que ele aparecesse para dizer: Oi, te adoro, podíamos ir ao Café de Flore? Só me permitam evocar pela última vez Samuca, pois escreveu Cinzas [ing.:Embers= Barrela] bem antes de Plínio.

Escreveu em outro lugar e isso muda tudo e todo texto, pois o topos nos pensa, já dizia...

O topos nos pensa, já dizia... e por isso este ano dei uma de minhas últimas disciplinas, chamada Tópico. Alunos e criadores de ementas e programas mal suspeitam que essa é a disciplina central de qualquer curso, corrida, que só corremos num mesmo lugar, seguindo uma pista, nunca importando de onde para onde. Mas sosseguem, vou parar por aqui com essas digressões pois realmente cansei de dar aulas. Vou felizmente aproveitar minha aposentadoria, pois o topos nos pensa, já dizia...

Pois o topos nos pensa, já dizia... e o topos das Crias de Mãe Júlia ( a Kristeva??? Ó mandem um beijo meu para aquela terrorista semiótica impenitente) pensou em mim tudo isso que precede, me fazendo viajar no tempo e em meus medos para dentro daquele porão que nos habita a todos em águas. Posso até não gostar de Plínio, mas deuses do olimpo, que caos fabuloso corrói suas paredes. Contemplo-o, rio de nossa geração. E só posso ter respeito. Imenso, profundo- usando todos meus adjetivos que medem lugares. Plínio é nosso lugar, pois não há margem, marginais, ensinava Heráclito: margens marginais desse me rio nunca são as mesmas, não é mesmo meus amigos?

O topos nos pensa, já dizia... e nos obriga a brigar por aquele lugar. Ô povo da Cultura Oficial aí de Caruaru, botar motoqueiros dormindo num espaço daqueles? Alugar para coisas tais um espaço daqueles, tão brincando? Foram os caruaruenses mesmo que votaram em vocês, foram? Vão para casa, vão criar ovelhas, mas deixem os lugares da cidade em paz! Aposentem-se definitivamente, como eu! Tivemos que ter um Moisés para salvar-nos das águas faraônicas do teatrão, das águas turvas e suspeitosas da Cultura Oficial, hoje representada no estado por Etc, pois é do lugar de cima que nos vem o exemplo, e da cultura de maldição, beatnik, michelotteana & tais, agora já sessentona. Não há como agradecer às Crias da Mãe Júlia e ao grande Moisés por uma bengalada dessas para abrir nosso mar de imbecilidades.

Eu amo-vos como amo Kil, o que segura minhas barras me ensinado a ler leio Caio, Plínio.

Continue de Olho Neles, Kil! Olho Neles era o que estava escrito nos muros da cidade de Recife para nos vigiarem- tempos de merda- por isso acho detestável agora que se foderam (?) ter que vigiá-los. É melhor esquecê-los mesmo, que apodreçamos no esquecimento todos nós, hoje velhinhos velhacos de uma história suja.

É um belo- como todos- Super 8 de Jomard. Mêu, eu disse Super 8?? Não há mais lugar para esse dizer, cara! O topos nos pensa em muros, já dizia..



A parte maldita

Moisés, Cris, Sérgio, Ary, Beto, Bob, Ítalo, Izak, Marcos, Ramatis, Jane, Gutemberg, Sebastião, meus encarcerados nessa Caruaru-de-Todos-Coronéis incluindo o de Limoeiro e os de 1922, 1928, 1964, os da Cultura Oficial de 2011 e os das Revoluções Asterísticas de 1.000.013, encarcerados por todos esses passarinhos mortos que insistem em governar os vivos, como dizia meu velho e bom Marx: eu anuncio a conveniência dessa coragem de vocês se manter viva. Pois essa, essa, essa, meu deus, essa, essa e ESSA não aquela, me comove às lágrimas. Verdade, eu já estava entrando em paranoia ali no beco de vocês, becos de todos nós que estivemos e vivemos becos, nós ratos e Mickey e maussss, habitantes daquele lugar que não pararemos de roer os pés de barro dessa Coisa aí, a Inominável cultura de Estado, entranhada dentro de cada um de nós, nos porões de nossa mente idiotizada, movendo gesto por gesto em mímese aos poderosos que nos fodem e aí a gente também fode o colega do lado, o ator ao lado, o escritor ao lado. E já tá de bom tamanho por que fodi muita gente hoje. Repetindo, claro, a cultura de mando, deles, os bostas que não tiram esse cu sádico aí de cima da gente. Não abandonem esse lugar nunca. Apossem-se dele, em nome do Povo de Caruaru que já tem uma longa e venerável história de se apossar do barro- utensílio para fazer Vitalinos, do violino judeu para fazer rabecas, das rabecas para fazer guitarras e quem sabem voltar ao violino, que sei eu desse eterno movimento por sobre um solo que é sempre o mesmo, é sempre o mesmo, é sempre o mesmo, é sempre despossuidamente, sempre miseravelmente fora dele mesmo, lugar sempre fora de lugar, topos que nos pensa, já dizia...

Vocês são os heróis da resistência- e lá venho eu de novo com as imagens gastas, velhas e nojentas de militar ou guerrilheiro, vanguardas & retaguardas, pirús e bundas moles dessa pôrra toda que graças a deus acabou.

Para mim acabou.

Então vamos aos cuidados que tenho com vocês, meus Brothers.

Temos cinco espaços a percorrer: Entrada, Salão de Acampamento dos Motoqueiros, A sala de Bilhetes, o Corredor, a Prisão.

Ficamos vigiados na Entrada, ficamos depois livres demais no Acampamento dos Motoqueiros, ficamos entregues a nós mesmos na Sala dos Bilhetes, no Corredor e na Prisão.

Inicia-se bem a Entrada, mantendo-nos num clima de realismo, pois se a cena- porão o pede e talvez o Plínio de 50 (socorra-nos Kil!), a postura então deve ser mantida ao longo do espetáculo.

E cai algumas vezes.

Quando passamos do Acampamento para a Sala dos Bilhetes e nela, espatifa-se o clima, apesar de minha ignorância suspeitar em algum cantinho dela que aquela é que é a sala do exercício de Verfrendung de vocês. Sala que, por um momento, nos

dá o sopro, a aragem- ou desgraça e ancia-

com que a chama do esforço se remoça,

e outra vez conquistemos a Distância,

e outra vez conquistemos a Distância,

do mar ou outra, mas que seja nossa!

Pessoa - em sua grafia original, ó redação - e não eu é quem nos mandou essa mensagem como uma prece junto com a Barrela de vocês!

Mas como ando com ojeriza de Brecht também- ah chega, vai!- sugiro sair direto do Acampamento dos Motoqueiros para o Corredor (Polonês), e depois a Prisão. Mantendo-se aí constante o controle da plateia. Nada de pancada, só controle. Pare- se, por exemplo, a peça em certa altura e troquem-se algumas pessoas de lugar. Depois continua- se. Bom, é um timing. Não serve absolutamente para nada. Mas vocês sabem que lá dentro há um ritual constante de fazer coisas que não servem absolutamente para nada. É isso aí. Ao final, após a entrada dos policiais na cela, sairiam todos nós para a Sala dos Bilhetes. Ou, como sugeriu Polly: porque não fazer o público sair para uma sala, absolutamente azul, de um dia absolutamente primoroso, claro, em espaço euforicamente se abrindo? Diz ela que a percepção final da volta ao lugar comum do dia lindo, ressaltaria a oposição entre a liberdade nossa, e por conseguinte o sufoco de tudo o que acabamos de ver.

Esse terceiro espaço pode ser sim, brechtiano, como o foi. Mas antes de nossa chegada ao locus final- quinto espaço de nossa jornada para o fundo de Plínio- a postura deve ser mantida. Há um ligeiro desmantelo e eu, velho conhecedor desses corredores, medi rapidamente todos os locais e momentos que me fariam fugir dali.

E algumas vezes, confesso que fugi.

O topos nos pensa, já dizia... O lugar tem que se pensar um pouco mais na plateia, esse morro grego, pois sei Moisés que você é nossa continuação, e não nossa volta ao passado, então não está querendo fazer terror com ninguém nem nos meter realisticamente em porão nenhum, pois sabes que toda nossa luta é para sair deles, é sair das lutas, sejam as das ditaduras ou das nossas, internas, ditas moles. Pô a gente quer é paz e felicidade para todo ser vivente na Terra, não é mesmo, meu bro?!! O resto são os do andar de cima que querem, esse desejo de poder é deles e não nosso, mesmo que nossas mãos um dia se carreguem de armas. Eu lutei nos 60/ 70 e não estou com meu rabo sentado em lugar algum dos de cima. Onde foram parar o rabo dos Genoino, vergonha, o rabo dos Dirceu, vergonha. Três mil vezes vergonha, shame on you all!

“É porque não conseguiu vencer, o trouxa!”- me dizem e dirão os pósteros da geração ressaca.

Como não, se eu sou o melhor com uma faca na mão e ainda estou por aqui, vivo em nome dos caídos todos dentro de mim?

Eu penso todo dia nessa minha plateia do lado daí dessa tênue telinha em que escrevo. Bolem como deixar a plateia de vocês num lugar mais exato para se ver Barrela e ser penetrado. O Jorge Bandeira sentou lá em cima, ao seu lado eu, ao meu Polly e... tava entupido! E aí chegaram lá para as tantas- algum guarda aí esqueceu de fechar os portões de acesso à entrada- chegaram três motoqueiros trogloditas que estavam grudados na cena. Tanto que um gigantesco cuja imensa bunda tapava toda a cara de Jorge, ainda perguntou: Tô trapalhando? E Jorge, com aquela coragem amazonense de mamar em onça, as verdadeiras, não as pintadas armoriais- retrucou seco: Está mesmo! Ora, tão grudado estava o troglodita que virou de novo o bundão, ajeitou-o carinhosamente na cara de Jorge e continuou assistindo numa náice, pois ele não sabia como sair dali, não conseguia fugir de modo algum. Pode- se concluir que Motoqueiros Selvagens também têm coração, ou não foram treinados como o Mickey Mausssss, mas a melhor conclusão é que há um problema ali no lugar da plateia, algo não programado por vocês, pois não creio que vocês fossem como aqueles do teatro de agressão dos anos 60 que queriam que o público não visse o espetáculo e sofresse muito. Moisés foi meu aluno muito viajado, mas doido nunca.

Acho que no todo era só para isso que eu pediria a atenção e cuidado de vocês. Agora finalmente posso ir-me, de alma lavada e antes disso devo confessar-lhes que no texto sobre a peça de Ariano eu me juntei a ele, a Jomard e a um punhado de outros velhinhos dos tempos da cultura bicuda, que insistem em viver ainda, para cantar os versos de Fernando Pessoa de uma imensa saudade do passado.

Menti, viu Saulo!

Quando eu me for eu não quero nenhuma lápide chorando o passado, por mais que seja em verso de Fernando, o maior poeta da Lusitânia. Eu nunca aprendi a me arrepender de nada, então como não ganhei cargos e essas coisas todas em troca dos porões que conheci, pois não foi para isso que lá tive que descer, peço humildemente que me concedam, amigos e inimigos de toso os quadrantes, ao menos uma honraria, cantando comigo em minha homenagem:

(michelotto...)

Vestiu uma camisa listrada e saiu por aí
Em vez de tomar chá com torrada ele as tomou para ti
Levava um canivete no cinto e um pandeiro na mão
E sorria quando o povo dizia: sossega, leão!
Sossega, leão!