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A Renascer Produções Culturais organiza o Seminário Internacional de Crítica Teatral desde 2005 evento que reúne estudantes, profissionais e estudiosos de diferentes formações acadêmicas em um compartilhar de experiência, opinião e conhecimento dos mais diversos países, com o propósito maior de fazer avançar o desenvolvimento do discurso crítico sobre a criação teatral, em todo o mundo. O exercício da crítica de teatro como disciplina e a contribuição para o desenvolvimento das suas bases metodológicas constituem, assim, a prática do Seminário Internacional de Crítica Teatral, levada a cabo por críticos do teatro e uma gama de especialistas nas áreas de conhecimento que entrecruzam comunicação, história, filosofia, arte, literatura e teoria teatral, dentre outras. O Seminário Internacional de Crítica Teatral é um projeto que busca implementar no estado de Pernambuco um espaço permanente de debate sobre a estética teatral contemporânea. A edição 2011 tem como tema o Teatro fora dos Eixos. Todas as atividades desenvolvidas pelo seminário terão como base a discussão das poéticas cênicas que estão se propondo em produzir trabalhos que estão fora do cânone do teatro ocidental.

sábado, 21 de agosto de 2010

Painel Crítico / Senhora dos Afogados (Espetáculo em processo)


Senhora a caminho

Kil Abreu

Senhora dos afogados, de meados dos anos 40, explica com objetividade por que Nelson Rodrigues foi alçado pela nossa crítica ao posto de dramaturgo central do modernismo brasileiro. É que a geração de Décio de Almeida Prado e Sábato Magaldi, que se notabilizaria por um embate ferrenho contra as velhas formas do teatro ligeiro vindas do século XIX, via no autor a possibilidade de síntese de um projeto estético para a cena que se firmaria, de fato, nas décadas seguintes. Se comparado à experiência européia tratava-se de um projeto de modernização conservadora. É que a crítica olhara para as nossas experiências vanguardistas valorando-as, ao menos em um primeiro momento, para baixo, mesmo que muitas delas tenham sido formalmente bem mais complexas no filtro da sociabilidade brasileira que as peças de Nelson (pensemos em Oswald Andrade). Basta ler, ainda hoje, as considerações de Barbara Heliodora sobre a montagem de O Rei da vela, pela Cia. dos atores, “criação de exceção” julgada teatralmente inviável. Oswald continua não cabendo nos escaninhos. Mas, há, claro, o fato de que Nelson tem obra mais lata e repercutiu oferecendo à cena a justa medida de assimilação esperada: reformista, ainda que não revolucionária.

Na montagem que a Cênica Cia de teatro prepara agora é o tema da Electra que rege a trama. Em uma república de assassinos (praticamente todos os personagens centrais), o fator de destino e determinação social é a tradição (trata-se de uma família de “trezentos anos” e de uma linhagem de mulheres supostamente puras e castas) e o elemento de danação é o apetite pelo incesto ou pela traição. Nele podemos ver o frescor da novidade moderna primeiro na tonalidade expressionista. Mais tarde isto se estenderia, na obra de Nelson, em outras versões brasileiras, em tema e linguagem, da tragédia, que aqui se aclimatou em um pacto de convivência negociado nos terrenos para nós acidentados do drama, envernizado com o sotaque local e sobre a base de argumentos e situações escandalosas, em uma arte de composição poética que, como sabemos, faz história.

Quanto à montagem sob a encenação de Erico José, as cenas que vimos alcançam até um pedaço do segundo ato e dizem de um processo em pleno andamento. Então as notas que seguem têm esta intenção também provisória, a partir do chão relativamente já firme que o grupo demarcou. Dado isto, não vamos entrar no mérito de questões específicas de desempenho e acabamento. Vou direto a uma ou duas questões gerais que talvez interessem.

A tomar pelas falas do grupo depois do ensaio, em que se disse sobre o processo de apropriação e abandono de alguns aspectos do treinamento, a Cênicas já intuiu a partir dos seus tateares na biomecânica meyerholdiana que os meios não podem ser os fins. Se por um lado a forma é ela mesma o conteúdo, por outro o processo formativo, os procedimentos de criação através dos quais a forma “se” forma, estes precisam ser alimentados por propósitos, intuições, diálogos com o mundo. É esta percepção da prática criativa já manifestada pela equipe - que não deve estar submetida ao encantamento provocado pela dramaturgia (a ponto de apenas ser reverente a ela), nem tampouco à afinação dos meios expressivos -, é esta percepção que, supomos, pede ainda mais espaço no trabalho de formalização do espetáculo.

Pelo relato do elenco parece claro o entendimento de que a técnica sozinha diria pouco. E dificilmente – a não ser que alcançasse um grau de virtuosismo extra-ordinário – deixaria de ser engolida por uma dramaturgia tão berrante e de contornos tão fortes quanto esta. Por isso, sem demérito ao ponto em que chegou a Cia, causa muito interesse o plano apresentado para o terceiro ato. Pelo que pudemos entender há ali uma promessa de autonomia poética maior, com o uso de elementos novos, segundo o que foi anunciado. O importante é que ao que parece não se trata de mero esteticismo. Esperemos que não. É que estão mesmo ali, no último quarto da ação, as razões que justificariam esta “virada” formal. É quando Misael, D. Eduarda, sua prole e vizinhança esquisitas assumem o despudor que se avoluma até o paroxismo, explodindo os desejos interditados na deleitosa aniquilação – coletiva - da norma em favor do desejo. Será difícil, portanto, manter o metro parnasiano que a encenação usa até aqui. Para benefício da verossimilhança a peça pede um descomedimento que também pode ser a senha para uma entrada mais autoral do grupo frente a Nelson, em uma conversa não reverente, mas pautada pela vontade de um diálogo verdadeiro entre artistas. E aí será útil pensar que em arte, assim como na vida, um diálogo franco não pode ter duas medidas de poder.

Salvo engano o espetáculo tende, então, a ser mais interessante quanto maior for a possibilidade de a Cênicas Cia. firmar sua voz própria. Há já um mais que razoável domínio dos meios, com a vigilância e o olhar rigoroso do encenador Erico José para a eficácia dos treinamentos que foram propostos. Isto não é pouco. Para além da montagem é coisa que sinaliza um tipo de procedimento de trabalho importante e parece que não muito usual no Recife. Mas, também não é tudo. Dominado o essencial do repertório é preciso que a morfologia vire sintaxe, que se articule em um discurso mais firme. Daí poderemos falar em linguagem. Não exatamente uma linguagem modelar, já escrita. Talvez uma linguagem nova, se necessário. E uma linguagem, a não ser que ela seja puro jogo formal – o que também seria legítimo, mas não parece ser este o caso - se institui em ponte com o mundo. Não apenas o mundo original e convidativo da peça, mas, sobretudo, a vida ordinária que estará pulsando, selvagem e atenta, no momento em que o pessoal da Cênicas pisar o palco para enfrentar Nelson.

Na percepção deste crítico o desafio não deveria dispensar, pois, a mediação do real e do presente. O discurso sobre a “universalidade” do texto, a “atemporalidade” poética da condição humana ou a sua carga “arquetípica” é algo que deve ficar para a platéia. Para o artista são clichês que não operacionalizam muita coisa. Desconfio que no fundo nem Antunes Filho precisou deles para as suas versões essencialistas e geniais, como em Nelson Rodrigues, o eterno retorno e Paraíso, Zona Norte. Estas coisas todas, se tomadas como princípio regente das tarefas de trabalho, de qualquer maneira não deveriam absolver a necessidade de leitura da peça, que de todo modo permanece lá. A questão é que aqui, como na criação em geral, será preciso antes de encontrar a esfinge inventar as perguntas que vão pautar aquele diálogo. Neste momento ele se apresenta nas bases de uma abordagem cuidadosa. Aguardemos para ver com quais inquietações ele se arredonda. Retomando o início, já sabemos que Nelson é o maior. Mas, o que interessa agora é saber sobre a maioridade da Cênicas Cia.



Senhora dos Afogados – Apontamentos críticos para um ensaio


Paulo Bio Toledo
(Obs.: Edição coletiva do texto com Juliene Codognotto em operação semelhante aos processos de colaboração e edição de textos na revista Bacante – www.bacante.com.br)

0. Ontem, antes de começarmos a assistir Senhora dos Afogados, fomos avisados de que aquilo era um ensaio. Paradoxalmente, o ambiente sóbrio e simples do ensaio pode deflagrar elementos muito interessantes. No caso, a composição simplificada (luz geral, figurinos neutros, aquecimento aos olhos do público, etc.) coloca em evidência algo muitas vezes esquecido no teatro, a saber, sua característica de troca, razão e pensamento ao invés do deslumbre, efeitos, beleza e contemplação. No ensaio de Senhora dos Afogados, projeta-se ao primeiro plano a dramaturgia e as escolhas técnicas de encenação e interpretação e, consequentemente, a apreensão cognitiva das mesmas – justamente por assumir seus elementos de ‘ensaio’. (não é possível saber como será a peça quando pronta... Mas muito dessa ambientação simplificada e despida de ilusões faz bastante bem ao espetáculo. E ao teatro, diga-se de passagem)

1. O que primeiro ressalta do esboço apresentado é a concepção coral dos “Vizinhos”. Sua construção é um passo além ao próprio texto de Nelson Rodrigues, pois ao conjugar todas as vozes dos vizinhos numa única aglutinação coral, os vizinhos, invariavelmente, ganham características dialéticas, são contraditórios (afirmam e negam, subsequentemente) e tornam-se um duvidoso mestre de cerimônias público; a escolha consegue dar conta do aspecto épico das tragédias e eleva “os vizinhos” a um status de protagonismo, que, paradoxalmente, faz sublinhar a situação central do texto – como um moldura mítica (e pública) em torno do desdobramento privado na casa da família. Então, a dicotomia presente na obra de Nelson Rodrigues: casa/cais, vizinhos, prostitutas, fica muito bem evidenciada quando se fortalece o elo dos vizinhos.

2. No entanto, as escolhas de representação no desenvolvimento dos Drummond parecem colocar em risco essa proposição inicial. Isso porque a construção das personagens e as ênfases das cenas contêm um forte direcionamento dramático (no final do ensaio, na conversa com o grupo, um dos atores referiu-se ao “drama...” ao que foi prontamente corrigido por uma atriz, que disse “a tragédia”). Assim, as personagens protagonizam diálogos intersubjetivos e são direcionadas e determinadas por esses diálogos, bem como pelas relações estabelecidas. Todavia, na tragédia rodrigueana a situação não se deixa levar pelos diálogos... Há uma determinação moral e mítica, as coisas caminham como que levadas por um “fio invisível” já traçado pela moral e pela hipocrisia da sociedade. Tudo já está dado em Senhora dos Afogados... Os caixões preparam-se antes dos seus mortos... O mar chama os Drummond (embora o chamado seja o eufemismo de assassinato)... e os Vizinhos narram e comentam fatos e perguntam coisas que parecem já conhecer.

Mas as personagens, neste ensaio, parecem ser construídas com base numa motivação psicológica, o que cria situações irresolúveis e momentos esquizofrênicos. Por exemplo, o primeiro quadro da tragédia: Clarinha acabou de morrer no mar (tal qual Dora)... Não se sabe se suicídio, acidente ou mesmo assassinato. Mas mãe e filha discutem, entre outras coisas, o noivado de Moema; ao mesmo tempo Misael está num banquete para sua promoção a ministro; e os vizinhos, como corvos, passeiam ao redor. Tentar resolver este quadro de forma dramática faz com que as personagens percam seu caráter mítico, talvez alegórico e principalmente trágico.

Representar Moema dramaticamente redundaria nas chagas da crise do drama, pois ficaria rebaixada a apenas um espécime patológico dos seres humanos e não como símbolo de uma teia moralista, tragicamente hipócrita e apodrecida que alicerça nossa sociedade – segundo Nelson Rodrigues. Ou seja, os Drummond aparecem, quando representados desse modo “dramático” buscando a verdade de cada indivíduo, apenas como uma família de loucos, assassinos e maníacos – e Moema como a mentecapta de uma trama perversa. E não como o que de fato são para Nelson: representantes trágicos da corrupção e deturpação sociais hipocritamente escamoteados no moralismo (principalmente sexual).

3. Por enquanto parece isso, mas claro que ainda há metade da peça... Tudo pode ser diferente e o terceiro ato pode mudar absolutamente todas as relações esboçadas acima (ou não)... Portanto uma crítica de um ensaio é apenas o ensaio de uma crítica...

4. De qualquer maneira, há algo que chama ainda a atenção: as motivações para lidar com o material de Nelson Rodrigues. De acordo com o debate ao final, o grupo pareceu mais impulsionado em lidar com o aparato técnico de Meyerhold antes de ter alguma motivação objetiva na obra de Nelson Rodrigues. A priori, parece que a obra é apenas a justificativa para o processo criativo embasado pelos treinamentos meyerholdianos. A despeito do grupo crer que a obra seja “atual” e denuncie a hipocrisia da sociedade, parece carecer de algo mais concreto no ‘porque’ de lidar com essa obra (polêmica e controversa, mas jamais consensual ou “genial” por si mesma) nos dias de hoje.

Não por acaso, várias das perguntas, na conversa final, questionavam justamente este lugar. Pois, por enquanto, não estão delineadas claramente quais as relações que o grupo pretende traçar entre a peça e a nossa sociedade atual.

É fácil se conformar com um “rótulo” da genialidade de determinada obra ou autor. O difícil é compreender, criticar e transpor suposto gênio para a representação teatral em outro tempo histórico. Há de se ter cuidado para que a técnica mantenha-se sempre como instrumento e jamais como objeto do ato teatral.


Duda Martins


Grupos de teatro que permitem abrir seus processos de criação para o grande público merecem crédito por seu ato de coragem. Primeiro porque expor um material inacabado, com todos os seus defeitos e todos os seus avanços é uma prova de humildade no teatro. Depois, o público, que é a razão de ser desta arte, pode ter acesso à um desenvolvimento às vezes mais valioso que o próprio produto final.

Foi essa a sensação ao assistir o ensaio aberto da montagem da Cênicas Cia de Repertório para o nelsonrodrigueano Senhora dos Afogados. O Teatro Hermilo Borba Filho foi palco de um escancaramento saudável, que nos fez sentir mais cúmplices do teatro que o normal. Sem aparato de iluminação ou figurino, os atores da companhia estavam livres para serem atores (diante do público) e esse é um exercício importante.

Montar Senhora dos Afogados, no entanto, não é das tarefas mais fáceis, por uma série de fatores. O texto já foi alvo de pesquisa de diversos grupos teatrais no Brasil inteiro e a quantidade de olhares distintos sob a mesma obra é infinita. Como produções cinematográficas que se valem das mais mirabolantes abordagens para tratar do mesmo tema, é perigoso que o teatro brasileiro esteja dando voltas ao redor de Nelson Rodrigues. E poucos são aqueles que conseguem, enfim, mergulhar na sua obra.

“Um mar que não devolve os corpos e onde os mortos não boiam!.” Esse é Nelson Rodrigues em Senhora dos Afogados. A Cênicas Cia. de Repertório parece estar entendendo o recado. O estudo do texto feito pelo diretor Érico José, sob a ótica do teatro de Meyerhold não afasta a “sua” Senhora dos Afogados de Nelson e essa é a grande sacada. Assim como os movimentos afroritualísticos adotados por ele também não são maiores do que a obra. Um diretor sábio é aquele que está a serviço do autor. Érico emprestou seus conhecimentos a Nelson e o resultado disso ¬– ainda sem ser resultado – tem sido bom. Mesmo lançando mão da biomecância de Meyerhold, que parte do pressuposto de que, genericamente, o corpo do ator pode dizer mais do que o próprio texto, iluminação, figurino, ou o que quer que seja, neste caso, o recurso não se transforma na questão basilar.

A montagem também parece superar uma outra armadilha de Nelson que é o drama. O texto é trágico demasiado, mas o humor peculiarmente sarcástico tão característico do dramaturgo também está presente. O melodramático, então, é suavizado com a participação do coro de vizinhos – até agora, o melhor e do espetáculo. Antunes Filho disse uma vez: "Os personagens do coro são capachos, o brasileiro sufocado pela sociedade patriarcal, hipócrita. O coro não tem a nobreza, ele está se virando, não teve vez. Os vizinhos e as mulheres do cais são versões modernas das Erínias, deusas da vingança e do castigo, que nas tragédias gregas atormentavam os protagonistas”. Bingo! Antunes acertou e a despeito de braços quebrados, o coro da Cênicas também. Que venha a estreia! Ou será melhor outro ensaio aberto?



IDEM (Many Lovers)

mi-CHE-lotto
É extremamente vantajoso escrever sobre ensaios. Vira também ensaio. E a gente aproveita para escrever sobre, como algo nada muito ligado.


Sobre ensaios

Vi um ensaio aberto de Katastrophè de Beckett, com Michel Lonsdale e era um tanto diferente. Creio que é bom bater um papo, curto, antes, sobre o que vai acontecer, o que vai se propôr, como todos iremos participar etc...

No Ensaio, vemos a coisa em pedaços. Claro que no dia será outra coisa. Essa talvez a grande preocupação do público e do crítico. Mas a gente não se diz todo dia que, cada dia, a peça é diferente? Nossos olhos fatiam constantemente todo aquele trabalho. Então não me parece que haja aí um grande problema.

Daí meu abraço fraterno a Wellington por começar essa prática por aqui.

Sobre peças fatiadas
 Na Revista Théâtre Populaire, #44 de 1961, um artigo sobre o Living Theatre se apresentando em Paris, há o seguinte comentário sobre Many Lovers, de William Carlos Wilson: “...você entra e passa uns bons 15 minutos vendo os técnicos preparando o palco enquanto os atores repetem seu papel à meia voz e uma atriz passa a ferro sua roupa e o “autor” diretor não cessando de intervir ao longo da representação. Cenário reduzido ao mínimo e composto sobretudo com pedaços de paus...a luz toda aberta etc ...etc.... ”.

Bom, acho que o que vimos ontem foi o melhor do Living, não?

Então, é sobre essa peça tão moderna chamada “todos estamos no palco!” que eu deveria falar hoje. O papo fica um pouco mais político, um pouco menos lírico. Coisa, das Sing-an-sich, essencial para qualquer papo, já disse o Paulo no seu texto- que eu amei- sobre o Fio Invisível e que tentei comentar, uma vez que eu mesmo, cansado de falas acadêmicas, pedi licença aos leitores para me agarrar só sobre meu coração e não em minha razão.

Dar uma descansada lírica.

Sobre a importância de se encontrar amigos

(vide Aristóteles, em algum capítulo da Poética, sans blague):

Esse espetáculo comporta três ex-alunas e um ex-aluno. Permitam-me falar de amor hoje.

Os outros ainda vou amar, pode deixar...

A primeira fez um Ato Sem Palavras desinformado. De castigo teve que fazer Katastrophè e dessa vez brilhou e continua brilhando por aí, Bruna, a filha.

Vanessa, a mãe, fez Valsa # 6 comigo e Wellington. Criamos um Coro em Valsa e a colocamos no coro. Formou-se, persistiu e está fazendo Nelson lindamente.

Que bem não faz à gente o sair da universidade!

Lane, dessa vez Coro, foi minha rainha e de Ban num Obaldia.

No papel principal ou no fundo do palco ou na platéia, é e será sempre nossa rainha.

Todos sabem que eu odeio pessoalmente diretores. Acho que o século XIX e a primeira metade do XX já acabaram. Mas aceito um ou dois, como Wellington, Ban, Érico e eu. Dizer que Érico foi meu aluno só me enche do mais santo orgulho. Eu o acompanhei quando pude. Fui sim. Fui a salvador só para vê-lo fazer um magnífico trabalho de bufão. Eu o seguiria até o fim dos tempos. Azar para quem não é, como eu e meu novo amigo Jorge Bandeira, Ara Watasara. O que não sei dizer que significa em japonês, mas graças a deus NÃO é japonês, é nossa língua geral, Nhengatu, a língua do Brasil, queiram uns ou não queiram outros. Então, maninhos, eu tenho algumas reservas ao que vi ontem. Mas Érico e os meninos da companhia resolverão tudo a tempo.

O que significa Ara Watasara? Perguntem a esse segundo índio que está na platéia do Seminário. O primeiro é Polly minha doce e bela iracema. O outro é esse menino tranqüilo que está me espantando com seu conhecimento, passando de Samuel a Meyerhold sem fadiga. O Jorge Bandeira, meu irmão ara watasara. Ele é sábio não por que acumula conhecimentos e os vomita por sobre a espantada audiência, mas por que os passa. É isso o que ele entende por passantes, passeios, andarilhos.

Não deixem de ler dele: A fabulosa loja dos bichos, pela editora Valer.

Por que “perguntem ao Jorge”? Por que ele tem uma coluna aqui também e é só abrir os comentários e falar com ele. Ele vai gostar. E também por que, pelo menos eu, só estou escrevendo para meus colegas de sala. São tantos amigos novos que estou louco para me pavonear para eles. Quando eu quiser escrever para os que vão ao teatro, escreverei em jornais. Até por que, quem lê crítica em Recife, é mesmo apenas a classe teatral.

E essa é ainda uma afirmação muito temerária.

Pois talvez ainda não tenhamos tanta classe assim.

Sobre Nelson

Permitam-me, antes de mais nada, uma homenagem a minha ex-sogra. Foi uma das pessoas mais bondosas que conheci no Planeta Terra. E tenho certeza, lá em cima também. Que fazer, ela acreditava piamente que havia o “lá em cima”. Não vou ser eu quem vai tirar isso dela.

Quando aqui cheguei, depois do longo inverno de nossa desesperança chegar ao fim (pensávamos tolamente), entrei no apartamento de Mãezinha e por sobre o piano estava o retrato de Nelson:

Eu (admirado)- Mãezinha, você também gosta dos escritos dele?!!!
Mãezinha (admirada)- Mário nunca escreveu nada, meu filho!
Eu (prá lá de admirado)- É o pai dele? Mãezinha, me diga, essa é a foto do Maracanã?
Mãezinha (já achando que tinha casado mal a filha)- Não, Paulo, não. É só o Mario.

Mário Rodrigues nunca escrevera uma só linha em toda sua vida. Era exatamente a cara de Nelson, com papada, aquela cara meio bovina e tudo. E era irmão dela.

Aí fui pesquisar e descobri que eu acabara de entrar na família de Nelson. Os restos que andaram ficando por aqui. Que pouco sabia ou se interessava pelos que haviam partido. Para o Rio de Janeiro.

Eu nasci no Rio em 1944. Os italianos morriam de medo. Todos acreditavam que todos italianos eram Mussolinis. Era guerra. Mas todos crescemos rindo. O carioca é um povo dado a amenidades disse o Sábato e com ele todo a mineirada ruim- por que falsamente séria- que injustamente invadiu o Rio, capital do país, capitaneados pelo Capanema. Por isso os mineiros quando podem nos alfinetam, vide entrevista antiga, de título O Último Crítico, na Piauí: “Cariocas são dados a festas, ao riso fácil, sei lá...”

Nelson foi pro Rio. Que era alegre mesmo, na mais larga das acepções do termo. E lá aprendeu a rir? O que sei é que cada vez que vejo Nelson virar tragédia, solamente tragédia, eu fico pensando se quem fala Nelson não está pensando Sábato. Que são duas coisas inteiramente di-fe-ren-tes.

Eu vi Paulo rir na minha frente, numa daquelas tiradas que só o Nelson tem. “Eu sou sua única filha!” Como um mineiro conseguiria rir da necessidade de uma filha querer apagar da memória da família as outras irmãs, para ela poder ser a única filha? É sublime, é uma piada sublime! E nada a ver com psicanálise e freuds, por que nem Nelson nem ninguém no Rio nunca o havia lido e nem lerá.

E é isso que talvez eu tenha a dizer sobre Nelson. Morro de medo de fazer Nelson. Passei a temê-lo depois que ouvi dizer que sua obra se dividia em:

(a) peças míticas, (b) psicológicas, (c) de embreagem fácil, (d) epifânicas, (e) Etceteras...

Quem divide assim é o Jean Anouilh. A sua obra. E não a dos outros, gente fina que era. Ou o Borges, cabra de enorme humor negro que era, tanto que foi viver na Inglaterra.

Desculpem-me. Mas um senhor que exige de nossos frígidos canais de televisão, que haja uma cabra ao lado dele como único ser vivo a assistir seu programa, não tem a menor vocação para tragédia. Tragi-comédia talvez. Pois esse era o gênero recém-descoberto. Ele era um bufão. Ele era um bufão. Ele era um carioca da gema. “Carioca da gema do ovo”. Que “rebola, bola,diz que dá que dá que dá, diz que dá que dá na bola, na bola você não dá” (música infantil dos anos 50).

Não tentem transformá-lo em “mineiro”, por que não dá não dá não dá não dá.

Alguém aí tem dúvida que Érico irá nos espantar com seu Nelson? Ele também é um bufão, ele também é um bufão. No Ensaio - era um ensaio - ainda vi uma leve persistência de um tom que não me agrada, que penso continuar envenenando a obra de Nelson, esse legítimo pôrralouca. Se há um nome dos anos 60 atribuível a ele é esse. Ele não se nomeia reacionário? Então estou sendo bem bonzinho, não?

Por quê? Ele não “descreve” a vida suburbana. Ele a faz agir em palco.

Toda sua obra vem de sua escritura jornalística. Seu público leitor, senhores, era eu, meu pai e um bando de mequetrefes. Um povinho do qual saiu uma pessoa louca armada procurando quem havia escrito que ele era corno e sapecou os tiros no primeiro Rodrigues que encontrou: seu irmão.

O corno(possesso, sentindo dores no chifre)- Morre você mesmo, já que seu pai não está aqui!

Tem gente que pensa que isso é folhetim de Nelson. Isso é que é ser suburbano. A morte ali, estúpida. Seu irmão pagando pelo pai, que não tinha talvez tanta dívida para tanto sangue derramado. Isso é ou não é Nelson?

Então, para toda obra de Nelson, comentada por Sábato e seguida por outros, me desculpem, tô fora e não abro.

Ah meu deus os ignorantes!

Ignorantes(com muita ignorância)- Mas o que é que ele tem contra Sábato? Inveja? Raiva? Amor não respondido?
Michelotto(angelical, com olhos do gato de Shrek, querendo se passar por um tal de Nelson)- Parem de ser suburbanos, pelasenhoradosafogados!

Eu fui com Sábato ver pela décima terceira vez, da parte dele, A falecida , de Nelson, lá no Sesc Pompéia. Esse amor de gente – todo mundo o conhece assim- estava escrevendo sobre a obra de Antunes e via, revia, revia. É um dos maiores pesquisadores do Brasil. É um leitor esfaimado. Ô cara, quem sou eu para comentar essas coisas dele! O que digo é apenas que, às vezes, nossos critérios de julgamento nos parecem bons, os melhores - no caso de um pesquisador- mas a gente entra em descompasso com o tempo. Ou sei lá por quê! Sei que a vida copia o teatro: cada dia é diferente e às vezes fazemos tanta coisa nela que distraímos de algumas essenciais. O banal. O banal é sempre essencial, me disse o Borges, me disse Nelson. O grande amigo de Nelson quis torná-lo sério, homem de letras, igual a José de Alencar ou algum outro da Academia. Coisas que só se faz para um amigo. E que o amigo, Nelson, deve ter ficado quieto e aceitado, pois afinal só sobrara esse como único caminho para ser reconhecido em um país de merda, pseudo-literário na maioria da vezes, um Rio besta cheio de mineiros bestas e engordados por sopinhas de belas letras e por outras sinecuras mais, que só um Capanema pode lhe proporcionar. E olha, era um mineiro, um desses mineiros, quem pacientemente se debruçou com ele sobre sua obra e sobre inúmeras médias de café com leite das madrugadas cariocas nos anos 50 e 60, quem sabe sentados ao lado do Michelotto, o Sylvio, meu pai do Diário da Noite por que a noite sempre junta os jornalistas.

Como não aceitar um presente de grego desses?

É essa minha versão pessoal para o que leio de Nelson e meus amigos (queiram eles ou não) Paulo Mendes Campos, Décio de Almeida, Mariângela, Sábato e tantos alguns outros.

Por favor, se um dia eu tiver uma lápide, ponham nela:

Lápide( rosa marmórea, límpida, florida e das mais caras)-

Aqui jaz o Michelotto.
Foi por amor.
Foi por amor que ele escreveu sempre.
Mesmo que muitas vezes se tenha enganado redondamente.
The rest is silence.

Michelotto (no céu, já chorando com pena de si mesmo) - Eles me amavam, cacêta!!!




Senhora dos Afogados pela Cênicas Cia de Repertório


Por Jorge Bandeira*

Gostaria de esclarecer que este crítico teatral do Amazonas escreve pela primeira vez sobre um trabalho em andamento, um work in process. Portanto, sinto-me na obrigação de superar-me e tentar, de forma sucinta, embarcar neste terreno perigoso de escrever algo sobre o que não pode ser, ou que seja apenas uma pálida imagem de um resultado final a ser levado à cena teatral de Pernambuco em setembro.

As coisas mudam com a força da maré. Mar. E sobre esse Mar que me escapa é que começo a tecer este texto, pois este elemento tão importante foi eclipsado pelo trágico de Senhora dos Afogados, e talvez, digo talvez com a certeza que os restante da carpintaria cênica aparecerá para resolver estes vazios, a colossal estrutura metálica no seu formato triangular para o espectados tenha contribuído para este “apagar” da atmosfera marítima, no texto de Nelson Rodrigues um dos constituintes fundamentais da trágica história de Misael Drumond e Moema.

Entendi perfeitamente a preocupação do elenco em demonstrar as etapas desta pesquisa que se alicerça sobre as teorias de Meyerhold e sua bio-mecânica, e acredito que este trabalho de contenção dos movimentos será ainda mais revitalizado, pois as marcas de entrada e saída estão fora deste compromisso de dialogar com o mestre russo. Questão de aprimorar tudo, e isto virá com a visualização total destes encadeamentos de cena, aqui mostrados em sua fase embrionária.

Trata-se de uma tragédia nos moldes clássicos, portanto, a leitura parcial deste primeiro ato(restam dois para a conclusão do texto de Nelson) permite apenas que o crítico aponte motes já resolvidos pela encenação. Um deles é o uso da estrutura metálica projetada com escadarias laterais e praticáveis em módulos que se sobrepoem como elementos incorporados à movimentação da cena e suas variações emocionais e de impacto ao espectador. Uma arquitetura de cena famosa no começo do século XX, via Gordon Craig, Appia e outros mestres do teatro. Até mesmo a clássica montagem de Vestido de Noiva referendou este legado.

O gigantismo da estrutura, insisto, não poderá desequilibrar a organicidade do espetáculo, caso contrário as personagens, em especial os elementos cruciais do coro de vizinhos e vizinhas, terá um tímido desempenho. E o coro desta Senhora dos Afogados da Cênicas Cia é o verdadeiro fio de ariadne para a compreensão estética, de linguagem, abraçada por esta Companhia Teatral.

A geometria tende a causar esta organicidade, este lapidar das retinas para as cenas marcadas, até aqui, neste ensaio aberto de 20/08/2010, dentro da Programação do Seminário Internacional de Crítica Teatral, funcionou a contento, mas esta mesma geometria pode levar aos intérpretes a uma acomodação da técnica da interpretação pelo comodismo tácito do geometrismo e marcas, mecanizando e enfraquecendo a trama trágica de Nelson. É apenas um ponto de reflexão, somente.

As máscaras, os conflitos familiares, este coro de vizinhos está na mesma transitoriedade de uma Yerma ou Bernarda Alba, e a correnteza deste mar de labdácidas arrasta tudo que encontra pela frente. As rezas e as danças circulares também estão neste nível do “aparecimento”. Falou-se no debate após este ensaio aberto(o segundo) que a pesquisa das manifestações afro-brasileiras foi realizada em dois terreiros. Talvez um comprometimento maior com estas entidades, muitas delas ligadas às forças do mar, seja o que falte para que a cena tenha um resultado mais plausível. Creio, somente.

Realizar com o corpo em sua totalidade, com o transe merecedor de autenticidade teatral, se isto é possível. Por isso as vozes dos personagens, nos momentos de alta tragicidade deste ato visto, sejam ecos apenas de uma possível desgraça, avassaladora, que deve jorrar sangue de todos os poros. Não estou aqui pretendendo que a pesquisa seja uma panacéia de defesas dos orixás, nada disso, mas ao entrar neste universo as trocas são necessárias, pois as energias também circulam de ambos os lados.

Atos extremados como os assassinatos tornam todos estes personagens vulcões em erupção, e uma interpretação contida, mesmo que na sua forma técnica perfeita, talvez “limpe” o vigor destas cenas em demasia. A punição e a culpa, nesta catarse que se faz necessária, não pode deixar de aparecer ao público, assim como este mar revolto, que em setembro deve demonstrar toda sua força.

*Crítico de arte, amazonense. Conselheiro de Cultura de Manaus, ator, diretor, dramaturgo, tradutor, poeta, coordenador do cine-clube Lippomusic . Historiador e especialista em História Social da Amazônia, História e Crítica da Arte(UFAM), Africanidades(UnB)

Recife, 21 de agosto de 2010.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Programação de Hoje

Demonstração de Trabalho
Senhora dos Afogados
20h Teatro Hermilo Borba Filho
Entrada Franca



Senhora dos Afogados é a única tragédia de Nelson Rodrigues que se passa em região praieira, na qual o mar atua diretamente nos impulsos e destinos de seus personagens. Se em Álbum de Família o núcleo trágico representa a aristocracia mineira, em Senhora dos Afogados, Nelson explode geograficamente o espaço trágico e constrói um espaço simbólico fiel, ao mesmo tempo, às suas temáticas autorais e à atmosfera e forma das tragédias clássicas. A praia onde acontece a história é tão selvagem quanto os personagens que se digladiam entre seus desejos e suas e a época, segundo o próprio autor, é indefinida, isto é, um acontecimento atemporal e geograficamente inexato. Também simbólica é a imagem do tempo e da noite: tudo acontece durante a noite, entrando madrugada a dentro e se desfechando na aurora. Toda uma existência se condensa em poucas horas.


Ficha Técnica: Texto: Nelson Rodrigues
Encenação e treinamento de ator: Érico José
Assistência de Direção: Edjalma Freitas
Atores: Alcides Córdova, Alexandre Guimarães, Ana Souza, Antônio Rodrigues, Bruna Castiel, Lane Cardoso, Luciana Barbosa, Sonia Carvalho,Vanessa Lins e Vinícus Vieira
Oficina para atores “Da energia à ação”: Joice Aglae
Análise ativa do texto: Joice Aglae e Érico José
Estrutura Cênica: George Cabral
Assistência de Cenografia e adereços: Altino Francisco
Cenotécnico: Marcos
Figurinos: Marcondes Lima
Confecção dos Figurinos: Maria Lima
Maquiagem: Gera Cyber
Desing de Luz e Operação: Luciana Raposo
Desing Gráfico: Alexandre Siqueira
Preparação Corporal: Mírian Asfóra
Preparação Vocal,Trilha Sonora e Desing de Som: Adriana Milet
Operação de Som: Cláudio Malaquias
Gerência de Produção: Antônio Rodrigues
Produção Executiva: Valdemir Rodrigues
Adm. Financeira: Sonia Carvalho
Realização: Cênicas Cia de Repertório
Duração: 1h

Programação de Hoje

Teatro Oriental de 2000 a 2010
Às 19h no Auditório do bloco J da Unicap
Rua Nunes Machado, 42, Boa Vista

No início do século XX, quando as alfândegas e físico dos japoneses mudaram significativamente, o teatro tradicional japonês Noh e Kabuki manteve a sua importância no campo do teatro com uma grande quantidade de público, embora ocasionalmente em seguida, ele disse que estava se esforçando para atrair novos públicos. A esses teatros tradicionais são adicionados vários tipos de teatro gerados desde a era moderna, como o teatro ocidental, o musical e o underground, o teatro japonês mostra sua imensa diversidade. Esta conferência estabelece um quadro geral do teatro japonês de hoje, e refere-se especificamente para o teatro alternativo japonês, que tem um espírito crítico.


Miyuki Takahashi - Em 2005, completou os estudos de mestrado na Universidade de Tsukuba, com a tese intitulada "Governança de teatro popular no México. Além de ser uma pesquisadora da arte popular de representação, é coordenadora do Comitê para o Japão Street Theatre Festival, coreógrafa e performer de mímica. Ela recebeu o prêmio de "Artista do Inferno" na Rua XI Festival de Teatro do Japão (2006, Tóquio). Participou do Festival Internacional de Antígona Magdalena Workshop (2006, Colômbia), IV Festival de Teatro da Comunidade Morelos (2006, Zapata) no Teatro Encontro Juan Alvarez (2007, Acapulco), em Franciscana Yohuala XIV Festival (Equal, 2008) XIII Encontro de Teatro com a Morte (2006, 2008, no DF), no II Encontro Nacional de Teatro de Tetela del Monte (Cuernavaca, 2010), entre outros. Em Tóquio, durante 10 anos deu aulas, cursos e workshops em mímica para jovens, adultos, crianças e pessoas de diferentes habilidades, e dedicado à coreografia de muitos anúncios e programas de televisão, simultaneamente realizando performances de seus próprios trabalhos de expressão corporal. Suas principais obras são: O último soldado do castelo de areia, uma aula divertida para Miyuki Bar, uma gueixa Farewell mais e as formigas do sexo masculino também choram ", entre outros. Atualmente é doutoranda do Centro de Estudos Asiáticos e Africano de El Colegio de México.

Painel Crítico / Fio Invisível da Minha Cabeça


ESSE FIO QUE NÃO SE PARTE

Duda Martins

O Fio Invisível da Minha Cabeça, da cabeça dele e da sua também. Breno Fittipaldi pega Além do Ponto, conto de Caio Fernando Abreu e joga no palco. Não, joga não. Coloca lá com todo o cuidado. Não mexe em nada. Em respeito, e até mesmo num gesto de precaução, foram mantidas todas as vírgulas, todos os pontos. E o que vem além do ponto chega através da interpretação de Henrique Ponzi. Um ator nu revelando o fio invisível da nossa cabeça.

Chovia, chovia, chovia e quem estava no pequeno Teatro Capiba na noite de ontem quase sentia os pingos molharem. Não, não haviam falhas nas instalações. Mas é que tudo nos fazia sentir mergulhados no cenário urbano de Porto Alegre, de Caio, e também de Henrique. A luz de Luciana Raposo e a sonoplastia de Sônia Guimarães trabalharam tão bem que impulsionaram o ator para fora do palco até que entrasse o personagem vivo, real. Beckett vinha e voltava à medida que seu niilismo se distanciava da realidade exposta ali, dilacerada e ao mesmo tempo tão escondida. Se o conto de Caio é verdadeiro, no palco ele foi ainda mais na movimentação de Ponzi. Preciso, ele vai até onde quer e pára. Chega no limite da emoção e não se permite transbordar. É um ator que segura firme as rédeas do seu personagem.

Ele queria entrar, mas não podia. A espera não valeu, a indecisão não valeu e era melhor que tivesse se embriagado com o conhaque barato. Nós também bebemos do conhaque barato. Nós também nos molhamos e nos sujamos na lama. Nós também sentimos muito frio e vergonha de chegar bêbados. Nós também batemos, batemos e não conseguimos entrar. Estávamos ligados por um fio invisível que me acompanhou até em casa. E até agora está na minha cabeça, chovendo, chovendo....

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Painel Crítico / Fio Invisível da Minha Cabeça

Os fios invisíveis das nossas cabeças


(Crônica pensando em Caio F.)

Kil Abreu

Conheci o Caio Fernando primeiro com os Morangos mofados, sucesso editorial que eu recebera em uma caixa grande, em uma periferia distante de Belém, como presente de um outro Caio, o Graco Prado, então dono da Brasiliense. Naquele tempo eu lia a revista da editora, a Primeiro Toque, e decidi em certo momento mandar uma carta tentando pechinchar o preço de algum livro, explicando toda a dureza daqueles dias, a falta de grana e o desejo de matar a sede no catálogo que, de fato, faria toda a diferença naquele início dos anos 80. O velho Graco, que eu não cheguei a conhecer pessoalmente, por algum motivo que ele também nunca se preocupou em explicar passou a me mandar, e por um bom tempo, caixas de livros de onde saltavam os espantos de gente da melhor qualidade.

Em coleções como a Cantadas Literárias e a Encanto Radical eu e uma geração de caras descobriam uma igreja à qual fazíamos visitas dedicadas, rezando pelos versos de Leminski, entre uma biografia de Marx e outra de Nietszche, entre um porre com Charles Bukowski e uma roda para estudar o trotskismo sob as manhãs calorentas do Colégio Paes de Carvalho. A certa altura apareceria o pornográfico e fundamental Porcos com Asas (menos pela literatura, mais pela política), dos italianos Marco Radice e Lidia Ravera, quando garotos e garotas, “tarefeiros” do PC italiano, eram narrados entre aventuras sexuais e militância, e sem nenhuma ortodoxia.

Nenhum destes autores foi tão essencial quanto o Caio Fernando. Literatura menor para alguns, escritor de cabeceira para muitos, ele foi o cara que sintetizou – talvez próximo àquilo que se convencionou chamar obra geracional – estas perspectivas todas, existenciais e políticas, em um momento no qual precisávamos demais de parceiros para meditar sobre aquele momento estranho pós-ditadura, com a sombra de um passado próximo que quem nasceu no fim dos anos 60 viveu apenas “acidentalmente” e sob a perspectiva incerta das mudanças na conjuntura social - e íntima – que atravessávamos. Olhando agora e desta distância talvez não seja demais dizer que muitos dos que tinham 18, 20 anos em meados dos 80 se aproximavam da sua literatura por compartilhar perguntas de dentro deste entremeio histórico, de uma geração que não viveu a luta e a barra setentista – como ele, exilado, viveu –, nem militou, nem desbundou. Estávamos em um lugar também incômodo de um Brasil a meio caminho de muitas coisas que só mais adiante se inaugurariam na política e no comportamento . E o Caio, que vivera intensamente as duas passagens, fazia da sua obra uma reflexão funda sobre as estruturas de sentimento que eram possíveis - sem sociologia, em chave pessoal e intransferível.

Zanzibar, Jad-bal-ja...

Estas notas talvez sirvam a uma aproximação ao espetáculo da Cia. do ator Nu. Ao assistir a Fio invisível da minha cabeça fica clara esta disposição do autor em remoer o fracasso que, representado em perspectiva íntima, é também sumo deste complexo momento da sociabilidade. No debate depois do espetáculo o Jorge Bandeira intuiu, com razão, uma aproximação com Beckett. E creio que esta intuição não se deve exatamente às coordenadas de linguagem do teatro beckettiano, das quais o texto guarda distâncias importantes, mas a um sentido essencial que também está em Caio, que é este da exploração poética do ato fracassado, do sujeito em busca ou em compasso de espera (da subjetividade, da História). E mais: diante de circunstâncias propositalmente borradas - personagens sem nome, um trajeto da ação quase em abstrato, apoiado apenas na informação do estado de natureza do mundo (a natureza física, chuva; a natureza solitária do sujeito, unidas diretamente pela mediação da linguagem). O ponto de chegada parece firme, mas está destinado também ao malogro. Porque chegar ao destino não significa arredondar o impasse, resolver a questão. Ao contrário, significa o anúncio do desespero e a demarcação radical do ilhamento.

O que logo se anuncia e vai ganhando evidência no decorrer da encenação a que assistimos em Recife é a de que a montagem dirigida por Breno Fittipaldi não quer correr o risco de afundar seus pés na dramaticidade. Não há muita simpatia pela idéia de conduzir a atuação rumo a uma composição psicologizada, de estudo dos estados da personagem . O atalho é outro, mais disposto a seguir uma construção relativamente racional, com o relato sendo desenhado por fora, de maneira que o mecanismo de trabalho do ator seja o de mimetizar, às vezes mais, às vezes menos figurativamente, a ação. Perigo. O canto da sereia quando da representação de textos narrativos. Mas, resolvido no espetáculo com sensibilidade. De um modo geral o diretor soube evitar a tautologia e soube preservar o equilíbrio entre a expressão do estado e o comentário feito pela ação física, com acento e predileção por este último.

Henrique Ponzi é um ator de recursos. Foi bom vê-lo em um outro trabalho, em tudo diferente de Encruzilhada Hamlet, fantasia cênica que a Cia. do ator nu levantou sob a direção mais que autoral de João Denys. Ali, por força da dramaturgia de bordas fugidias, reinventada a cada réplica e em um fluxo de pensamento enlouquecido, foi possível ver na pele de Henrique a composição de um coveiro de língua hábil no andamento da fala, posta a correr em alta velocidade, e nas possibilidades do gesto dentro de um espaço mínimo de representação. Neste atual ele aparece mais repousado, por conta de um texto em que a reflexão é interiorizada, ainda que tome aquela direção proposta por Fittipaldi, a de um teatralismo que evita os grandes arroubos expressivos e se assenta em gestualidade ela mesma exibida como coisa estudada.

O “resfriamento” da emoção que a montagem propõe é uma resposta razoável a uma época em que a dramaticidade tem se produtificado de tal maneira que os artistas mais atentos, por uma questão de sobrevivência da autonomia artística, têm procurado se desvencilhar de todo chamado ao registro do melodrama que rege parte do teatro decalcado na teledramaturgia. Ou, de outro modo, têm experimentado exercícios de desmontagem ou re-estilização de gênero.

Esta seria uma frente de onde podemos tirar algumas questões úteis sobre o espetáculo. Em outra proponho, para tentar entender mais verticalmente a montagem, retomar agora pela contraface aquele aspecto da historicidade. Quando o pessoal da Cia. relata o seu processo de aproximação do texto e de criação do espetáculo destacando não os motivos (ou aqueles e-motivos) que os levaram às escolhas, mas os procedimentos construtivos (fazer melhor neste ou naquele espaço, usar este ou aquele recurso, estabelecer esta ou aquela relação com a platéia) isso nos ajuda a entender que o campo de interesse deles pactua o sentido da escolha às possibilidades da performance, talvez com ênfase nesta segunda. Por isso a angústia tão cara à narrativa só se firma no final, na sua auto-descrição, quando o personagem bate à porta que não abre. É que parece não haver mesmo, por princípio, urgência na expressão, e o espetáculo nos diz isto na sua forma.

Neste aspecto esta não quer ser apenas uma análise de valor, ainda que haja valoração subliminar. O que se afirma aqui é que as soluções encontradas talvez sejam as soluções possíveis para a época, levadas à cena de maneira sustentada do ponto de vista técnico: uma representação relativamente racional do conto e que pode sê-lo, tem espaço histórico para ser assimilada sem sustos desta maneira, neste momento.

Este crítico teve a felicidade de conviver um pouco com o Caio F. já quando o querido gaúcho de Santiago estava próximo a nos deixar. Eu adaptei a sua Dama da Noite para uma montagem em Belém e por conta disso tivemos uma aproximação. Uma vez eu disse a ele o quanto havia sido importante, para mim e uma geração de “pequenos monstros” (Os Dragões não conhecem o paraíso), silenciosos nos seus mundos secretos, a leitura das suas histórias. E ele respondeu que esse conto, Pequeno monstro, tinha o sentido solar que ele gostaria de ver traduzido na apropriação da sua obra, quase sempre tratada apenas com as tintas pesadas que também estão lá, mas que não alcançam tudo o que há nela. Tenho a pretensão de dizer que em minha opinião ele aprovaria este Fio invisível da minha cabeça, que tem a qualidade de nos colocar de volta, singela e doídamente, a meditar e a roer nossos ossos à frente de portas que queremos ver abertas. Mas, sem choro nem ranger de dentes. Neste sentido não me parece prostrante. Quem sabe daqui possamos então reclamar, à beira do mar aberto, por aquelas coisas e lugares desconhecidos e de nomes sonoros, como quem invoca a palavra mágica que tem poder para abrir as tais portas: “ Zanzibar, Bukula, Mensahib, Nikima, Jad-bal-ja”...

Painel Crítico / Fio Invisível da Minha Cabeça

Puxando o fio [invisível] desde a minha cabeça até o bonde da história


Paulo Bio Toledo
(Obs.: Edição coletiva do texto com Juliene Codognotto em operação semelhante aos processos de colaboração e edição de textos na revista Bacante – www.bacante.com.br)


“quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados”

(Manuel Bandeira)

Conhaque barato e maço de cigarros molhado... Frio cortante, as árvores secas do inverno e ainda chove... garrafa apertada contra o peito, pedra, garrafa quebrada, lama... “Um fio invisível saindo da cabeça dele até a minha”. (e uma “navalha pros meus olhos”)

O acúmulo das metáforas e das imagens é duro e concreto, lirismo-material que não se perde em tergiversações “híbridas”, “ambíguas”, “regurgitadas” e abstratas da alma, do ser, do espírito, do amor... Tudo é absolutamente determinado – avalanche de concreto, frio e conhaque – por uma simples definição de gênero: o fio invisível que sai da cabeça DELE ... e não DELA; uma única letra (E... e não A) faz de toda e cada sentença uma nova lírica pautada por uma luta interna, mas encarniçada, no campo da sexualidade.

Henrique é um ator simples (nu), objetivamente seguro, e mastiga a dureza de cada palavra de Caio Fernando Abreu... Cospe as imagens; cria universos narrativos; compõe, solitário, o frio, a lama e o “ponto” a ser ultrapassado; com poucas palavras Henrique materializa – sobre o vazio do palco – a rua escura por onde caminha; o faz de maneira mais lírica e pungente do que se víssemos de fato a rua, a chuva e o conhaque barato numa película cinematográfica (ou em nossas próprias vidas).

Por outro lado, entre o contexto de ontem e o de hoje há abismos conjunturais... tantas incisões cirúrgicas, evoluções e involução social, recriação de imaginário... (empresas de conhaque barato vão e voltam da bancarrota; os cigarros são e não são bem-vindos), que o “ponto a ir além” de ontem, de Caio, por certo mudou de lugar – terá ido mais adiante? Voltado alguns passos?

Certo é que as linhas de Caio e sua definição de gênero (E... e não A) não parecem hoje aparecer do mesmo modo. Talvez a solidão e o amargor de lidar com a homossexualidade sejam tão ou mais intensos que ontem, contudo há um contexto político e moral (geralmente bastante hipócrita) em que há um “status” de aceitação da homossexualidade – seja “festiva”, como nas grandes demonstrações nas paradas gays pelo mundo todo e nos ícones da sociedade assumindo publicamente sua homossexualidade, seja na institucionalização política e jurídica dos direitos cívicos do homossexual (cujo maior exemplo é a boa notícia da legislação positiva – em efeito dominó pelo mundo – sobre o casamento gay), etc.

O que não significa, de maneira alguma, a desatualização histórica do tema. Pelo contrário, coloca-o na ordem do dia. A grande força da obra de Caio Fernando Abreu é justamente lidar com o contexto castrador de uma época, portanto, parece exigir que ao nos valermos de seu material literário tenhamos que lidar também com o contexto histórico em suas variantes e continuidades.

Assim, ao escolher levar ao palco, hoje, a referência pontual à situação proposta pelo conto, sem considerar as mudanças no contexto, a peça não consegue chegar ao mesmo lugar que o texto original: não possui o caráter político escancarado de outrora ao lidar com as questões da homossexualidade marginalizada, da dureza amargurada (por vezes sem saída) de um mundo masculino e opressor. De modo que o aspecto político que a obra exala, de maneira sufocadoramente bela, fica em segundo plano, pois não é confrontado com a transformação imensa que a questão da sexualidade sofreu nestas quase três décadas – a contar da escritura do conto. Então, o que fica verdadeiramente em evidência na peça é o puro lirismo... Concreto e incisivo, porém puro lirismo; destaca-se apenas a beleza avassaladora do texto catalisada com a potência de representação narrativa que o ator possui. Mas o contexto político (de confrontação, de subversão individual, da dor anárquica) que grita o conto de Caio Fernando Abreu é submerso, afogado pelos tempos... E o espetáculo parece fechar seus olhos a isso...

“Estou farto do lirismo namorador
[...] De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo
[...] – Não quero mais saber do lirismo que não é libertação”

(Manuel Bandeira)

Painel Crítico / Fio Invisível da Minha Cabeça

Fios visíveis de nossa cabeça


Mi”che”lotto
Vou tentar ser acadêmico:

1. A parte interna da problemática queeerrrrrrrrrrrrrr

1.1. Você sabia quer aquele barulhinho queeeeeeeeerrrrrrrrr que algumas máquinas fotográficas fazem- Oh Modernidade! Oh Technologia! Oh!uôtâuonddeerfulluôrd! (em inglês de tradutor Google) pode ser corrigido com um simples apertar da tecla Mute? Confesso que consegui também tirar duas fotos, two pics, mas a minha máquina- oh invejosos! – é uma Rolex Pinter a duplo carburador icônico, total reflex de braçadeiraseauinorombóides puras com censor de ruídos embutido, modelo 2.400 xtall... E, sobretudo, NÃO é madeinchina, visse?!

1.2. Você sabia que aquele barulhinho tem por função dizer, em linguagem queeeerrrrr: “olha eu aí, bonecas, falando para o mundo!!!!”? É uma gravação no chip e não um ruído mecânico.

1.3 Você sabia que depois que me enfronhei com essa coisa de querer-ser-queerrr já não sei mais bem como falar sobre alguns temas como: sexualidade, sexualidade, ou sexualidade? Acho que vou ter que reler (tenho todos) o, às vezes tremendamente chato e fatigante colega e depois disso ex- amigo, Trevisan (Trevisan= de Treviso, o que tem 3 olhos, segundo meu tradutor Google.)

1.4. Você sabia que Hooligans, Google são criações de Swift tanto quanto Quark, a partícula mágica do Universo é de Joyce? Literatura, como vêem ainda pode servir para alguma coisa neste nosso mundo techno.

2. A parte externa da problemática queeerrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr

Quero também contribuir com minhas anotações para o estudo da problemática queerrr. Mas aquela começada nos anos 60 com o Woman´s Lib. Sou mais mulher.

Creio que fiquei com essa problemática queerrr na cabeça, por me parecer que ela está to-tal-men-te ligada ao teatro. O ator é seu duplo, dizia Artaud, aqui to-tal-men-te fora de contexto. E é também um dupla face, um duas caras, um Janus- breve, para muitos, um tremendo sacana- enquanto que para os meus gregos e o Nelson Rodrigues ele é apenas um hipócrites (Google= hipócrita. E dessa vez acertou!!!!) desde Eurípedes, Sófocles, Ésquilo e todos os gregos.

O ator segundo os gregos do andar aí de cima e segundo Caio, tem um fio ligando sua cabeça à do outro. Então ele nunca está só. Então como poderia ele em cena ser a nossa solidão?

O meu tradutor Google, esse desgraçado, traduz Solidão por Desamparo.

Desamparo tem algo de choro por si mesmo, auto-piedade. Solidão, não.

Beckett é solidão. O resto é desamparo. Beckett diz que existe em algum ponto uma cadeira de balanço onde, seja lá como for, a solidão humana se encontra e é amparada sem choro. Amparada no outro, na mãe da senhora que desce ao porão como ela já havia descido e veste seu melhor vestido para sair à noite, como ela havia vestido. E etc.

Discordo, pois da fala posterior de Breno (acho um crime obrigar o artista a falar sobre sua obra e sobre si, como se a obra não tivesse acabado de ser vista e falada por todos os buracos de sua cabeça) quando disse que Beckett tem algo a ver com religião. É um papo corrente em Recife, mas insisto, NÃO veio de mim, apesar de ter sido o iniciador desses estudos por aqui. Andam por aí reduzindo duas guerras mundiais a essa bobagem de religiosidade. A crise européia foi muito, muito maior. Graças a deus. Tentando esclarecer (sou teólogo, vige!!!): a morte de deus é um tema muito falado na teologia dos anos 60 sobretudo, como um problema decorrente do desenvolvimento do capitalismo no ocidente. E não exatamente como um problema de deus. Teologal, portanto. Deus só vive e morre para os que creem n’Ele. Nós, Joyce, Samuel, eu, ateus muitos e vários, não estamos nem aí para isso. Oh ele é ateu, então, viu, tem algo a ver com deus. Não, cacêta, evitei a palavra AGNÓSTICO para não cair nessa sua versão google. Eu não quero ser chamado de ignorante, que é o que significa a-gnóstico...

Tenho dificuldades teóricas de imaginar Samuel, Joyce ou esse humílimo Eu, caindo de joelhos. “No de rodillas, no”- já gritou La Pasionaria.

Samuel não cai. Joyce não cai. Eu não Caio.

Voltemos então a Caio, ou melhor, a Henrique, alias Digger do fabuloso Encruzilhada Hamlet. Esse personagenzinho que deu há muiiiito tempo o nome à nossa Companhia de Teatro e Dança Pós- Contemporânea: DIG. Dig it, saca?!

Eu amooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo Henrique! Ô puta ator!

(viu que a linguagem resolve problemas de gênero? Eu não disse “ô ator puta!”) Eu queria muito mesmo ser ele! Já o cantei para vir trabalhar conosco no Dig- o que não vai dar certo porque o michelotto, logo o Dig, não suporta ficar de joelhos à porta da Igrejinha da Cultura Universal, esperando vergonhosas esmolas dos Fundos, que nos corrompem a alma e travam nossa ação. O Dig espera outra coisa dos Fundos, por isso também somos queer. Somos baixos e pro- fundos (trad. Google: bas-fond).

Mas quem não é?!

3. Sem problemas queer

O fio de Caio, Henrique, Breno, Caetano, Samuel, Lenon e de toda ficha técnica me comoveu profundamente a primeira vez que eu o vi. É um desamparo total, em tom morno, mofado. Como os morangos de Bergman. Saca o clima de P. Alegre: o bar, o papo, o frio lá fora, o mundo em si, a noite em si, sem choro, sem choro?!

No Sesc a luz estava violenta e abrupta. O som, explosão e nervoso. O diretor nervoso. Uma sala nervosa que não quer ou não pode se adaptar ao pequenino tamanho gigante interno de Caio. E tudo isso, senhores, caiu por sobre os ombros de nosso Síssifo Henrique, o ator, que só queria entrar naquela porta, que só queria entrar naquela porta, que só queria entrar naquela porta (e eu já estou me arrepiando pois estou vendo Henrique bater lá e bater lá e me fazer chorar filhodaputa que eu quero usar um pouco minha razão acadêmica hoje mas não consigo pois o filhodaputa do Henrique está batendo naquela porta. Por detrás da qual, sabemos todos já de antemão, não há ninguém, não há ninguém e esse é o texto mais chupado de Lenon e do Berceuse de Samuel que já vi na minha vida então chorei, pôrra, homem também chora e foi aí que me encontrei nesse conto adaptado para cena por esses dois preciosos e lindos meninos, o Breno e o Henrique foi aí que me encontrei com o Caio, do qual eu tinha alguma birra sei lá por quê, enrustimento talvez, sifu, sei lá. Caio, na primeira vez que vi o Fio de Henrique e Breno, ligou o fio de sua cabeça à cabeças tão grandes e generosas. De falar bonito e generoso, fluente e curto de meu Joyce, Lenon, Samuel, sem cobrar nada, nada de imposto. Só liberdade. Só. Só lhe dão o quê, se lhe dão tudo? Cabeça dos pardais frágeis de Ophélia, dos passarinhos de Manoel de Barros. Cabeça de seres que como eu e Manoel, somos doutores em formigas.

Penso que é isso que é ser queer.

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Notas de Rodapé (não há trabalho acadêmico sem elas. Podemos quase dizer que o trabalho acadêmico SÃO elas!!!!)



1- Breno, me devolve o Neruda que você me roubou. Digo, os Beckett.

2- O Caio conto é aqui MONÓLOGO. Mas que diabos seria um monólogo deveria se perguntar Sábato ao afirmar que monólogo não é teatro, em uma revista cujo nome, ano, número esqueço, mas caramba não posso botar um rodapé de notas no rodapé. E quem vai se lembrar (com alegria) de tudo isso um dia? Entendo que em teatro não há nunca monólogo, Caio já disse: há um fio ligando uma cabeça a outra, mesmo que estejamos perdidamente, miseravelmente desamparados por cima de um palco perdido nos fundos de uma Casa Amarela. Talvez por usar uma noção antiga e rasteira de monólogo (pô Proust taí, Joyce taí com o já cansável monologo interior etc)
Sábato acabou por se esquecer a natureza mesma de tudo isso que fazemos, o angu da cena, a luz, alimento e sopro do mundo: em cena NUNCA há um só ator, NUNCA um só personagem, NUNCA uma só humanidade, NUNCA uma só história, NUNCA um só FIM ( Lano de Lins já nos ensinou no outro dia!).


Há apenas um caminhar, sempre caminhar. Para dentro da longa noite dos tempos. Que certamente é a noite de nosso Desejo, do humano desejo.


Rodrigo, em sua palestra sobre o Universo Queer, entre seus pontos de pesquisa, anunciou, bri-lhan-te-men-te, a retomada da Problemática do Desejo. Tão maltratada depois que se esqueceram de Freud, Lacan e tantos.


A essa caminhada do desejo por entre a Noite dos Tempos nomeamos ação, disse o Hamlet. E por isso João Denis, belamente, o travou no meio do palco, naquele cenário bico de seio de Oh happy days! de Samuel. Diabos por que tanta gente se recusou a ver a ação de Denis e sobretudo, sobretudo, desse gigante chamado Henrique?


3- Lembrando para Leydson: Trevisan é de uma leitura pé-no-saco. Conseguiu fazer Jô Soares dormir, quando esteve naquele programa. A abertura do livro sobre Thomas Mann foi re-escrita e discutida na sala de meu ex-apartamento aqui em Candeias.


Trê (pros íntimos), é sério demais.
CAI A NOITE. CAIO




Por Jorge Bandeira*

A espera desespera. Eis o mote central deste monólogo FIO INVISÍVEL DA MINHA CABEÇA, texto teatral elaborado coletivamente a partir do conto “Além do Ponto”, de Caio Fernando Abreu. A Companhia do Ator Nu, de forma econômica e certeira, nos brinda com este espetáculo onde a chuva torrencial e emocional do personagem nos faz adentrar neste Teatro minimalista, solitário. E o faz com força de atuação e precisão nos diversos elementos da cena. Uma espera brutal, que no plano do tempo real do espetáculo se condensa em pouco mais de quarenta minutos.

No início temos um preparação no hall, já com uma situação de saudosismo, num ambiente com discos de vinil e um aparelho de som recheado de algumas cantoras muito referendadas pelo autor do conto, entre elas, Bethânia e Angela Rô Rô. E um sensual barman que nos oferece o conhaque, aquele fatal conhaque que colocará, minutos depois, nosso personagem numa situação um tanto quanto absurda, esperando o que não virá. Não precisamos citar Beckett, pois a referência não minimiza em nenhum aspecto a originalidade da situação orquestrada por Breno Fittipaldi(diretor) e Henrique Ponzi(atuação). Essa garrafa de conhaque barato, juntamento com a chuva, o frio e a umidade transformam a atmosfera teatral em reminiscências que ganham vida pela força de atuação e controle gestual e de fala do intérprete, mesmo nos eventuais elementos de interferência que ocorreram no decorrer desta apresentação.

A verve interpretativa de Ponzi se estabelece mesmo nos momentos de aparente inércia do personagem solitário, na abertura, em especial, com a VAMPIRO de Mautner, cantada por Caetano, temos este rigor interpretativo. Aliás, a música nos remete, ocasionalmente, ao próprio personagem solitário e eremita como um vampiro que sai na noite em busca de seu sangue essencial para a sua vida, sua busca pelo homem que ama, ou que pensa amar...

Henrique Ponzi demonstra sua total entrega em cenas de aprumo e perícia como ator, destaco àquelas onde lida inteligentemente com as extremidades de seu corpo, onde mãos e pés também clamam e “falam”, por esta corporeidade, de sentimentos e momentos de tensão e relaxamentos. No conto original temos uma referência importante da forma em que Caio Fernando Abreu visualizou este homem solitário, com “sua sola fina esburacada dos sapatos”, o que não foi uma opção da direção, mas que não elimina a possível vinculação deste universo becketiano pela via do clown, que aliás chega em minhas retinas pela composição de figurino e pelos percalços de silêncios que volta e meia fazem com que o personagem solitário volte-se à sua condição existencial de observador de sua condição, mas sem a capacidade de mudá-la em sua jornada de padecimentos.

Os objetos de cena, uma pequena árvore, um banco, salientam este isolamento de uma busca pelo invisível, pelo que foi perdido, pelo inexistente. Só o sentimento de afeto vigora nesta condição colocada em cena, de forma nua e crua pela Companhia do Ator Nu. Em meia hora de atuação Henrique Ponzi nos alenta nesta trágica condição: esperar, e esperar, e nada ter, e tudo clamar por ele, seu Godot, seu coração, seu amor, sua eterna espera. Momento especial de sua atuação é aquele onde o banco(mais um objeto de solidão!) é transmutado, metamorfoseado ante nossos olhos em seu objeto de procura , na qual conduz nosso imaginário ao plano real da satisfação de seus prazeres desconhecidos. Somente pelo pensamento ele terá está satisfação e gozo garantidos.

Nada se completa verdadeiramente para este personagem habitante de um deserto, onde o óasis de seu coração apenas visualiza miragens, imagens que aparecem e somem com a mesma rapidez. A iluminação é eficaz e também insere-se nesta pesquisa minimalista de tornar o simples em total, sem prolongamentos desnecessários para arroubos ou exageros, aliás outra marca segura deste espetáculo.

O diretor, de forma bastante coerente, garantiu as “rubricas” do conto “Além do Ponto”, onde destaco esta passagem, “...coloca um pé após o outro, equilibrando a cabeça sobre os ombros, mantendo ereta ereta a coluna vertebral...”, movimentos corporais executados integralmente pelo personagem posto em cena por Ponzi. Outra referência literária que temos é do estranho personagem de Franz Kafka, do conto “Diante da Justiça”, que foi inserido em passagem de sua obra-prima “O Processo”. O personagem de Kafka bate infinitamente numa porta, e quando chega seu interlocutor, o aviso é simples, a porta não abrirá jamais. E por falar nisso, curioso lembrar que o nome do ator, Ponzi, me faz pensar em POZZO. A certeza é uma só: um bom Teatro não precisa de muito, apenas da verdade. Fio Invisível traz essa verdade ao palco.


*Ator, diretor e crítico de arte, Amazonense. Membro do Conselho de Cultura de Manaus, tradutor, poeta, escritor e dramaturgo.
e-mail: vicaflag@hotmail.com

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Programação de Hoje


Fio Invisível da Minha Cabeça
Teatro Capiba - Sesc de Casa Amarela
As 20h

Fio Invisível da Minha Cabeça é um monólogo que fala da busca por um sentimento que põe em questionamento os conceitos que construímos ao longo da vida. É um desafio interior, uma luta para superar o limite que faz explodir em cada um a imensa vontade de ser feliz. Esse espetáculo proporciona uma atmosfera noturna, urbana, cheia de referências de vida agitada, onde o cotidiano sufoca o sentimento, mas que no íntimo o coração pulsa como forma recorrente de mostrar-se vivo, como uma ferida que pulsa e sangra.


Narra-se a trajetória de um homem que, numa noite de chuva, vai ao encontro de alguém. No decorrer do caminho, no entanto, instaura-se em sua mente um grande dilema: comparecer ao encontro marcado ou retornar; ao chegar à metade do caminho, percebe que não pode mais voltar atrás. Decidido a seguir em frente, ele se apressa, tentando recuperar o tempo perdido; entretanto, quando se vê no local combinado, dá-se conta de que algo irreversível aconteceu.

Ficha Técnica: Texto: ”Além do Ponto”
Autor: Caio Fernando Abreu
Dramaturgia: Coletiva criada a partir do conto “Além do Ponto” de Caio Fernando Abreu
Atuação: Henrique Ponzi
Direção: Breno Fittipaldi
Cenografia e Figurinos: Breno Fittipaldi, Edjalma Freitas e Henrique Ponzi
Preparação Corporal: Míriam Asfóra
Preparação Vocal: Rose Mary de Abreu Martins
Sonoplastia e Trilha Sonora Original: Sônia Guimarães
Criação, Montagem e Operação de Luz: Luciana Raposo
Operação de Sonoplastia: José Neto
Programação Visual: Marcelo do Ó
Comunicação, Produção Geral e Realização: Companhia do Ator Nu
Duração: 45 min

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Programação de Hoje


Palestra: Bonecas falando para o mundo: transformismo e performance da (des)identidade pernambucana
Com Rodrigo Dourado*
Resumo: Investigamos as relações históricas, estéticas e políticas entre os grupos Vivencial Diversiones, Trupe do Barulho e Coletivo Angu, numa panorâmica da Cena Queer pernambucana dos anos 70 do século XX aos nossos dias. Analisamos como esses grupos constroem imagens e representações do desviante sexual metaforizadas especialmente na figura do transformista traduzindo uma experiência do sujeito subalterno, atravessada pelo imaginário da cidade do Recife em sua condição de “margem” do mundo. Buscamos compreender, então, como essas teatralidades híbridas e mestiças encontram na condição “Trans” sua melhor síntese, performando a experiência do entrelugar, a (des)identidade do sujeito pós-colonial e, por isso, encontrando ecos tão expressivos nas audiências.

*Rodrigo Dourado - Jornalista, professor, diretor, mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutorando em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia. Colaborador da Revista Continente Multicultural, foi editor do Portal TeatroPE e um dos organizadores da série Memórias da Cena Pernambucana.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Programação de Hoje


Ás 19h - Auditório do Bloco J da Unicap (Rua Nunes Machado, 42, Boa Vista)

*Ian Herbert
Palestra: Teatro Europeu de 2000 a 2010 -

Resumo:
As grandes mudanças no teatro europeu datam de antes do ano 2000, tendo início com a queda do muro de Berlim em 1989. Esse foi o momento em que o teatro do antigo bloco soviético saiu de anos de censura e repressão para renascer como um teatro nacional com características próprias. Não houve, todavia, uma corrida para encenar peças que foram proibidas em épocas anteriores. Na verdade, provavelmente os comentários mais interessantes sobre o retorno da democracia na Europa Oriental partiram de autores britânicos. O final do século XX viu também o fim do domínio do teatro europeu por alguns excepcionais diretores como Giorgio Strehler, Lubimov Yuri, Peter Brook, Peter Stein e Patrice Chéreau, os quais parecem ter sido, em certos momentos, menos saudados, ainda que apresentassem trabalhos de qualidade. Em outra esfera, a propagação mundial do musical popular que ainda era comercialmente forte nas produções de Andrew Lloyd Webber e Cameron Mackintosh, foi se tornando menos influente em termos artísticos. A primeira década do novo milênio foi marcada por mudanças na técnica e na importância do teatro em muitos países europeus. Avanços no uso do som e da iluminação tornaram as produções mais ousadas, e a introdução de câmeras no palco levou o teatro para mais perto do cinema. A escola de teatro baseada no texto já não ocupa um lugar central, e onde era priorizado esse tipo de teatro, é provável que tenha sido submetido a adaptações “pós-modernas” que muitas vezes o tornou irreconhecível. Um resultado positivo desta iconoclastia é uma maior ênfase no teatro físico e planejado, além de uma fusão de dança e teatro. A mímica e o teatro de marionetes voltaram à cena, contribuindo para desvendamentos valiosos no teatro europeu. Ocorreu também uma busca salutar pelas velhas tradições teatrais de outras partes do mundo, incluindo Índia, Japão e China. Intercâmbio maior, dado geralmente através de festivais, possibilitou aos encenadores experimentarem o que havia de melhor em muitos outros países, incluindo o teatro de grandes companhias da América latina. A cena também sai do espaço do teatro convencional, com belos trabalhos realizados em espaços alternativos. Contudo, o teatro continua a cumprir seu papel social bem como artístico com o desenvolvimento do teatro político e de documentário em muitos países do continente, e com as tentativas do lado oriental de tocar em temas antes reprimidos e embaraçosos de sua história recente. A ênfase em novos dramaturgos, lidando com temas contemporâneos, muitas vezes violentos, amplamente difundidos desde suas primeiras abordagens pelos britânicos do In-yer-face Theatre*, mas que se pode afirmar terem sido adaptados na maioria dos países desde um primeiro momento -o qual não podemos considerar estéril-, numa tentativa ingênua em benefício próprio. Em meu trabalho, convido todos para a reflexão sobre algumas destas tendências, enfocando os grupos e diretores de toda a Europa que estiveram envolvidos em alguns dos trabalhos mais interessantes do período destacado.


*Ian Herbert - Foi editor e divulgador da revista Theatre Record de 1981 até 2003, sendo atualmente seu consultor. De 1984 a 1991, editou a revista de técnicas de teatro Sightline. Hoje escreve regularmente para revistas de teatro do mundo inteiro, o que inclui uma coluna quinzenal no jornal The Stage. Presidente de 2001 a 2008 da Associação Internacional de Críticos de Teatro da qual é agora presidente honorário, dirigiu nesta os Seminários de Jovens Críticos de 1994 a 2001. Em Londres, ele também é presidente da Sociedade de Pesquisa Teatral e administrador do Círculo de Críticos e da Coleção de Teatro Mander & Mitchenson. Herbert é ainda professor visitante de três universidades dos Estados Unidos e lecionou em vários países do mundo.

Painel Crítico / Paloma Para Matar



Paloma para matar: Vigor radical, forma conservadora

Kil Abreu

Paloma para matar respira um entorno muito favorável. Tem a aderência da platéia e a aprovação de uma parte do pessoal de teatro – que reconhece no espetáculo, com razão, um sopro inquieto que talvez esteja mesmo faltando nos palcos da cidade. O elenco comandado por Lano de Lins está resguardado, por um lado, pelo sentimento de satisfação de quem vai ao teatro sequioso por boas gargalhadas e, por outro, pela sempre bem vinda percepção – mas nem sempre regular – de que o fazer teatro é ou pode ser motivo de uma sobrevivência viável, quando este é o projeto . Na linha de um espetáculo de entretenimento isto seria o fundamental. Vale o ingresso, pois. Mas isto, evidentemente, não é tudo.

Na montagem é claro que o travestimento do elenco é o recurso cômico fundamental e este mesmo já é parte da tradição cômica. Mas, não se trata só de uma história em versão travesti. O transformismo e os jogos com as identidades são o mote da dramaturgia e por vezes aparecem como tema, no primeiro plano da narrativa; por vezes surgem no segundo plano, mais acidentalmente, abastecendo o andamento da trama com o combustível das gags e outros achados humorísticos. Ainda mais que isso, as bonecas que movimentam o qüiproquó também têm parentesco em um DNA social reconhecível. São bichinhas “pão com ovo”, perfis a partir dos quais se pode olhar, de um lado, um ambiente determinado e, de outro, o desdobramento de um imaginário que amplia comicamente, na estratégia caricatural, os papéis, os desejos, as interdições e o reconhecimento crítico (sobretudo auto-irônico), tendo como eixos este dito lugar de classe em que elas se reconhecem (os sonhos de projeção, a partir dele) e as dobras da sexualidade.

Há na encenação uma teatralidade vital, que empresta elementos da farsa despudorada, em especial do gênero de humor que podemos ver nas intervenções de boate. Há ainda o arremate que caminha para o performático, no esforço de estreitar o espaço entre arte e vida, o momento da representação e o seu entorno. Esta intenção de quebrar as mediações entre o que está sendo representado e a platéia, em uma argumentação direta e de efeito certeiro, é elemento fundamental de comunicação da cena e ganha bom espaço, reconhecido generosamente pelo público.

Norma, ruptura

É sempre possível intuir alguma radicalidade poética nestas ações de travestimento, sejam elas momentâneas ou permanentes (quando dão o salto de qualidade e mudam de status): a sua opção decidida a favor do próprio desejo. Mesmo naqueles momentos em que o travestir-se está protegido pelo evento lúdico, como no carnaval, ou quando ganha expressão ampla na sua extensão mais corajosa, a assunção do transsexualismo, há este elemento de grande poeticidade e politicidade. Porque travestir-se ou mudar de sexo é algo para si, mas, também e fundamentalmente, algo para o outro.

Este argumento talvez sirva como apoio para discutir algumas das implicações de forma e sentido que o espetáculo faz ver. É que nele, ainda que esta força vital esteja suficientemente instalada - traduzida em lances cômicos de bom efeito, amarrada através da costura paródica e sustentada em ótimas performances para o gênero -, aquela radicalidade e, em certa medida, aquele frescor infantil (sem trocadilho) das coisas pensadas com o coração aparecem disciplinados em uma forma careta e em tudo conservadora. O espetáculo tem, então, esta contradição fundamental. A vitalidade inquieta e rebelde da sua presença funcionando a favor de uma estrutura teatral velha, inspirada no que há de mais carcomido no humor televisivo. Se olharmos com algum interesse nesta direção infelizmente só poderemos enxergar o pastiche de temas e experiências estas também já decalcadas de outras, desde o argumento do tipo “rapaz hetero, pai gay”, já explorado à exaustão sobretudo pelo cinema americano, até a marcação cênica televisiva (bastante frontalizada) e a cenografia quarto e sala do teatrão. No limite, não será exagero dizer que o espetáculo, de dentro do espírito iconoclasta e do humor deliberadamente esculhambado que o move, está atrás das grades do teatro inofensivo de classe média. As bichas estão enquadradas e, aí, não há novidade, é mais do mesmo.

Quando o diretor Lano de Lins nos disse, no encontro depois do espetáculo, que há uma preocupação grande com os palavrões porque há sempre crianças na platéia e cada vez mais velhinhos e etc, isto nos dá a medida do enquadramento. Isto é ilegítmo? Claro que não, quem dirá que sim? Como falava Brecht, em tempos confusos, primeiro a barriga, depois a moral. Já sabemos que o artista precisa pagar suas contas e que hoje só os grandes românticos e xiitas resistem a dissociação entre labuta artística e finanças. Mas, mesmo assim, para aqueles que ainda não hipotecaram os seus rins e neurônios nos balcões do mercado – creio que seja o caso dos artistas deste espetáculo, em que sobrevive um vigor invejável e que interessa muito – ainda assim, nem que seja por uma questão de princípio, será preciso reafirmar a necessidade dos lugares de invenção do teatro. E da desobediência também. Felizmente, ao contrário do que diz o encenador, sobrevive, sim, talvez a contragosto, uma malcriação produtiva, que por vezes lambe o grotesco e que é importante para este trabalho. Não seria bom enxugar isto. As criancinhas podem ir assistir a outro espetáculo, paciência, não é possível dar conta de tudo.

Esta não é uma fala contra nenhuma coordenada de gênero, da iconologia pop (o procedimento paródico, este é importantíssimo) ou muito menos quanto ao desejo do popular que o espetáculo pauta. É a favor da criação. E o princípio de criação precisa, pelo menos, implicar alguma dialética entre o que está posto e o que precisa ser inventado. Não se trata de militância de gênero – coisa que o espetáculo não quer ser; nem do exercício da novidade ou da diferença pela diferença, o que redunda por vezes em estéril formalismo e mata um tipo de energia fértil e de compromisso com a vida que artistas como os deste espetáculo parecem ter de sobra. Se trata, ao contrário, de pactuar, a partir do tema da transformação que é tão caro ao trabalho, uma extensão simbólica que alcance a própria forma do fazer.

Esta seria uma questão que interessa, sem perder as opções que já foram feitas, no campo da comédia e em torno dos temas que foram apontados? Talvez não. Mas, sem isto provavelmente a traquinagem sacana das garotas de Paloma para matar estará submetida ao espaço estreito de um teatro ele mesmo morto. De grande efeito, mas que não movimenta nada. É preciso dizer que uma arte altamente convencional e copiada de matrizes já gastas e testadas é também legítima, ainda que tenda a estar mais para a prática cultural, no sentido ampliado de procedimentos já inscritos, que para a arte propriamente dita, que implica ruptura. Mas, no limite, é legítima, tanto que provavelmente dá conta, em nosso caso, do teatro hegemônico no Brasil hoje. O problema é que o enquadramento no legitimado certamente está dispensando um tanto do talento que muitos artistas têm empenhado em cena, Brasil afora e em Recife também. E já houve por aqui o Vivencial Diversiones. O momento é outro e, a favor da lógica, é claro que não queremos experiências repetidas, mesmo porque a esta altura isto significaria fazer teatro igualmente morto, ou de museu. Mas, como nos dizia Heiner Muller, é preciso meditar junto aos nossos mortos, conversar com eles e saber o que eles têm a nos oferecer.

Painel Crítico / Paloma Para Matar

Paulo Michelotto
“Acostumando-me, no decorrer dos anos, a aceitar minhas limitações,
confesso que tenho pelo besteirol indisfarçável horror.”


Sábato Magaldi - aquele da foto do Seminário de Crítica de 2005- foi quem disse isso, um ano antes, em sua edição do Panorama do Teatro Brasileiro, p. 322.

Permitam-me, como bom acadêmico, dar como título uma citação emblemática. Mas isso aqui não é mais jornalismo de papel, graças a deus, é eletrônico e aí a gente tem espaço à vontade. E menos censores.

Temos no DIG (http://www.dimprovizzogang.blogspot.com/) uma norma aprendida com Paul Vauchon do Théâtre du Soleil, segundo a qual toda crítica só pode ser construtiva, positiva. Negatividades só servem para demonstrar a fraqueza do crítico. Positividade significa: falar e mostrar caminho. Se não souber fazer isso, melhor calar-se. Claro essa NÃO é a regra da ácida Bárbara e nos parece que nem do nobre Sábato, nem de meu amigo Décio de Almeida Prado. Nem, a bem da verdade, da antiga crítica. Eles se levavam muito a sério.


Vocês sabem bem que quando um crítico começa com muito arrodeio é por que está com problema.

E eu estou.

Talvez por que se minha cabeleira punk o nega, a sua parte coberta de neve insiste em me colocar no banco desses meus antiqüíssimos colegas citados ai acima.


O fato é simples: eu adooooooorei e ao mesmo tempo achei um monte de, a meu ver, erros.

E para seguir a regra áurea do DIG e do Soleil eu deveria falar a parte maldita apenas para o elenco, pois só a eles interessa. O caso é que o público, senhores, o nosso inescrutável público sempre pede sangue. Quem é o público? “Essa senhora gorda” dizia Nelson um tempo em que se podia erradamente rir dessa associação. Sábato que é um nobre senhor foi quem mais escreveu sobre Nelson e foi amigo dele. Não lembro de uma linha sequer dele relembrando a Nelson seus defeitos. Talvez os dissesse em particular.

Mas eu vou dizer aqui. Pois espero, espero mesmo, que os editores permitam respostas. O que em jornal impresso é uma piada de mau gosto.

Paloma para matar tem atores que dançam bem. Tem atores que zombam das interpretações recomendadas por Stanislaviski e outros ETs de dois séculos atrás. Todos têm um bom timing em cena. Breve eu (não Sábato, não Bárbara, não Celarént, não Darií, nem Ferió...) os acho muito bons atores. Mas sendo um mezzo-musical eles precisam também cantar ao vivo.

Cantem até desafinado, mas cantem. Parem por favor com essa mania velhuska de botar música gravada e dublar. Estamos no século XXI: o Vivencial Diversiones foi há já um século atrás, não se esqueçam. Então, meninas, cantem, como passarinhos que são.

Eu, crítico, passarei, vocês passarinhos. (Obrigado, grandioso Mário Quintana, pela piada!)

Não conheço o texto original da peça. Deve ser um horror indisfarçável, diria o insuspeito Sábato. Eu apenas acho que ele comporta algumas correções. Lano de Lins já fez algumas e muito bem feitas como aquele final tríplice. Divertido por que inteligente.

As piadas politicamente incorretas: sobre negros, religião afro, ou gordos merecem maior atenção da parte de vocês do que a dada pelo aplauso fácil de uma platéia via de regra racista, preconceituosa, como somos todos nós aqui no Brasil.

Não quero ser um Sábato, andando pelo século XXI horrorizado. Não creio em nada politicamente correto. Política, no século XXI NÃO é coisa correta!

Mas parece-me que nós, implicados em tudo isso (e não críticos vacinados) precisamos urgentemente repensar tudo isso.

Inclusive as piadas sobre viado.

Conheço muitos gays – e são muitos – que não se sentem nada confortáveis com nossas pequenas piadas, internas ao teatro, “sem má intenção”.

Mas qual seria a diferença entre intenção e gesto? Nem Ruy Guerra, nem Chico nem Fernando Pessoa responderam. Sobrou para nós.

Nem todos somos os mesmos gays, nem todos somos os mesmos negros, nem todos somos os mesmos brancos. Somos todos apenas um monte de belas diferenças.

O que nos dá semelhança e nossa cara é apenas a pobreza cultural e econômica generalizada & brasileira, que se espalha feito um fantasma amedrontando o século XXI – diria meu bom Marx se estivesse aqui a meu lado.

Isso se confunde com nossa suburbanidade. Da qual Nelson Rodrigues foi o primeiro grande escritor. E é essa a parte mais horrorosa para uns e mais saudável para outros – como eu – do trabalho de vocês. Ninguém, em nosso panorama mal contado do teatro nacional, foi tão Nelson quanto vocês, as Vivecas ou a Trupe do Barulho.

Historiadores – que colecionam coisas prontas – odeiam admitir que aqui, em Recife, tem um Nelson nascendo todo dia em cada esquina. Mas para crescer com um Nelson, há que se lapidar, há que se cortar, há que se cuidar, há que se estudar mais dramaturgia, há que se olhar nosso povo com mais carinho, talvez mesmo ler mais, sei lá...

Afinal, dizia ele, tem-se que conhecer toda a dramaturgia grega para se escrever uma só crônica esportiva!

Mais que ninguém, Nelson soube se divertir.

Virou um carioca, “essa gente mais afeita às manifestações ligeiras” (Sábato, 322).

E isso me dá o gancho para voltar a Lano Lins que, como ótimo rodrigueano, afirmou: "Teatro é diversão!".

Quem esquece disso são os falsos sérios, os falsos moedeiros. Que ganham suas vidas e dinheiro com o choro fácil.

Alguém ainda tem que lembrar a esses senhores sérios, desmemoriados & passados da crítica, que fazer rir é mais difícil que fazer chorar? Já que é para se ensinar, vamos ensinar: di-versão está com a mesma raiz de di-versidade, de com-versão, de re-versão, de in-versão e de per-versão. Bacon colocava o teatro entre as “traditivas”. É arte por ser tra-dução, versão, ou ver-são. Nos anos 60 chamavam-se as bichas de “invertidos”. Não é curioso? Será que se espera que através da diversão teatral se convertam em alguma coisa? Mas qual?

Tento responder a mim mesmo, uma vez que crítica também é apenas uma versão:

"Acostumando-me, no decorrer dos anos, a NÃO aceitar minhas limitações, confesso que tenho pelo besteirol indisfarçável amor."

Mickey Mausssss, aliás Michelotto,
direto do século V, Elas.

Painel Crítico / Paloma Para Matar

POP-ULAR
Paulo Bio Toledo


“Oh, oh, oh, oh, ohhhh, ohh-oh-e-ohh-oh-oh”
(GAGA, Lady. Poker Face. In: Pós-Pop-
Dialectical Reason. Iraq: God save us, 2010)

“Eh, eh, eh, eh, eh, eh... Stop telephoning me
Eh, eh, eh, eh, eh, eh... I'm busy
Eh, eh, eh, eh, eh, eh... Stop telephoning me
Eh, eh, eh, eh, eh, eh...”
(Idem. Telephone. Op Cit.)


Paloma para Matar é um caos. Porém, originalmente, a história é simples: três travestis dividem um barraco em Casa Amarela (bairro de Recife) e compartilham ali suas desventuras na miséria social, quando Gabriel, o filho de um deles vem visitar o pai (às vezes mãe) para contar que vai se casar com Paloma e que ela está chegando para visitar a família do amado. Os travestis armam chiliques histéricos e quando chega a noiva iniciam uma disputa frenética de ofensas disfarçadas. A peça se desenrola até descobrirem que Paloma, na verdade “não é bolacha, mas biscoito Champagne!” e, pior, é antigo desafeto de Jurema (mãe/pai de Gabriel) – pois esta a venceu num antigo concurso – e está ali, de fato, para se vingar.

Este era o imbróglio original... “coisa poca”, diriam alguns, por isso – não satisfeitos – os atores e o diretor Lano de Lins resolveram rechear o enredo assemelhando cada uma das personagens a um ícone pop atual: Beyoncé, Britney Spears, Lady Gaga, Amy Winehouse, Whitney Houston, Justin Timberlake e, por fim, na parede do barraco a foto da Deusa-anciã: Madonna.

A peça então é entremeada com números musicais – adaptações cômicas das famosas paradas de sucesso dos respectivos ícones pop na atualidade. O que evidencia, talvez, um aspecto do espetáculo: a sua disposição em ser um show de variedades humorístico. Ou seja, ser uma descarga de piadas, paródias musicais e situações de humor escrachado com o objetivo de gerar um acontecimento de entretenimento “popular”. De modo que as situações e o desenrolar de trama no espetáculo tornam-se apenas pretexto para o desbunde. A situação serve ao humor e não o contrário. Isto é, o desenrolar da peça é reduzido a uma justificativa para o show cômico-trash do grupo.

O procedimento não é novo, basta ligar a TV no sábado a noite – no programa Zorra Total, por exemplo, (entre tantos outros) – e veremos ali uma eterna imagem deste tipo de operação humorística. Inclusive com as mesmas linhagens temáticas e recursos cômicos: pobreza, sexualidade, ridicularização física, paródia a “mitologia” pop, escatologia etc. (exemplo http://www.youtube.com/watch?v=vDHDmTgN4Do).

Este alinhamento a cultura de massas traz a tona uma confusão conceitual em torno do que seja popular – conceito extremamente controverso com dezenas de possíveis acepções. O termo popular pode estar associado tanto a manifestações espontâneas e/ou tradicionais de um povo ou de uma região como a um processo social de democratização do acesso a arte; pode significar tanto a arte feita pelo próprio povo – sem distinções significativas de critério entre criador e receptor – como a arte pensada para o povo. Todavia, uma comum acepção do termo é aquela que hoje é mais bem definida com o vocábulo inglês abreviado: pop. O pop refere-se, fundamentalmente, à cultura massificada ao extremo; às manifestações ligadas a indústria cultural que se alastram mundialmente com uma velocidade incrível movidas a combustível publicitário e pela imposição cultural construída pelas grandes mídias, distribuidoras, produtoras, lobby empresarial etc. – para estes, as fronteiras entre arte e mercadoria já não existem mais (ou nunca existiu).

Em Paloma para Matar a impressão é que há uma tentativa de, através da cultura pop, atingir uma popularização da arte, pois o espetáculo se vale da referência (mitificada) dos ícones pop, mas os apresenta na patética situação da miséria extrema e com alto grau de regionalização (tanto no vocabulário quanto nas referências cômicas – ambos ligados a Pernambuco e, especificamente, a Recife) como que “abrasileirando” a referência pop. No entanto, o problema é muito mais complexo. A começar pelo fato de o universo pop explorado não ser visualizado de forma crítica – ou seja, o espetáculo se utiliza do imaginário pop como elo de ligação com o público supostamente popular, só que ao proceder assim a peça se alinha a todo o aparato perverso da cultura de massas, vira difusora da mesma. Ao invés de perceber criticamente que esse “elo” comum (cultura pop) é algo imposto, alienante e socialmente construído pelos meios dominantes, o grupo aceita este universo como língua naturalmente universal.

Assim, o seu humor torna-se uma versão underground (terceiro-mundista) da própria indústria pop. Tenta-se popularizar o teatro se valendo da parafernália ideológica mais do que disseminada na TV, música, cinema (Hollywood) etc., mas só o que se consegue é massificar o teatro.

Curiosamente, antes de assistir Paloma para Matar, assisti Os Fuzis da Sra. Carrar, com direção de João Denys. No texto, Brecht demonstra a fragilidade da posição de neutralidade. E, em certa altura do espetáculo sobre a Guerra Civil Espanhola, alguém proclama referindo a luta contra o fascismo de Franco:

“se você não está contra eles, você está colaborando com eles”

Talvez esta seja a sina de todo artista, ontem e hoje.